EIS O MEU CORPO QUE É DADO POR VÓS
Enquanto retomamos nossa peregrinação espiritual através da vivência da liturgia do tempo comum, a solenidade de hoje nos recorda que se desejarmos percorrer este caminho até a sua conclusão, não poderemos ter outro alimento senão aquele que fortalece para a vida eterna: a Eucaristia. Assim a liturgia nos oferece duas palavras para acolhermos o dom do amor de Deus: Bênção e Ação de Graças.
A primeira leitura (Gn 14,18-20) nos apresenta o misterioso rei sacerdote Melquisedec, cujos feitos, apesar de pouco mencionados nos livros sagrados, o fizeram ser denominado como “Sacerdote do Deus Altíssimo”. Os dons do pão e do vinho juntamente com a bênção dada a Abraão indicam uma celebração de ação de graças a Deus por saciar as necessidades tanto corporais quantos espirituais de toda humanidade.
Na segunda leitura (1Cor 11,23-26) nos apresenta o relato mais antigo sobre a Ceia do Senhor – provavelmente redigido no ano 56 – que chegou até o Apóstolo Paulo através da tradição dos apóstolos. Em suas breves palavras, Paulo evidencia a íntima relação entre a Eucaristia e o amor fraterno. Por isto, o Apóstolo nos lembra que a celebração não se trata de mero simbolismo teatral, mas expressão concreta de unidade e comunhão com o Salvador e sua proposta de amor. Cada vez que comemos do mesmo pão (Corpo) e bebemos do mesmo cálice (Sangue) anunciamos a morte do Senhor; morte não como fracasso, mas como maior manifestação do amor de Deus pela humanidade.
No Evangelho (Lc 9,11b-17), Jesus, a Verbo de Deus que se tornou carne, enquanto caminha em direção a Jerusalém para oferecer sua divina vida pela nossa salvação, oferece alimento material para uma numerosa multidão que tem fome e sede de Deus. Mais tarde, antes de oferecer-se na Cruz, apresentará sua generosidade divina através do Pão que dá vida nova ao mundo. A oferta que Ele faz de si mesmo na Cruz foi antecipada na oferta da Eucaristia e a oblação da Eucaristia expressa sua doação plena pela nossa redenção. É o Senhor quem profere a ação de graças e oferece o alimento, mas a distribuição é realizada pelos discípulos. O serviço realizado por eles é sinal e expressão de que a Igreja deve sofrer e se doar pelo seu Mestre como Ele próprio o fez. Permanece em Jesus quem o comunga e permanecer em Jesus significa viver o seu projeto do Reino.
Na festa de Corpus Christi, a cada ano, a Igreja atualiza o mistério vivido na Quinta-feira Santa, mas o celebra com uma espiritualidade marcada pela Ressurreição. Se na Última Ceia, depois de partilhar o pão, os apóstolos seguem em procissão com Jesus para o Horto das Oliveiras para uma noite de agonia, traição e perseguição rumo a via cruz, na noite de Corpus Christi, retomamos esta procissão, mas já na alegria da Ressurreição rumo a vida eterna.
As celebrações suntuosas, onde se instalam as divisões e nas quais alguns são privilegiados e outros humilhados esvaziam a força e o sentido deste amor que lava os nossos pés enquanto se prepara para lavar nossos pecados na cruz. Tais celebrações repletas de ritos, mas vazias de amor porque estão tomadas por ambição e egocentrismo, destroem a Unidade que a comunhão do Corpo de Cristo exige. Comungar o Senhor, seu Corpo e seu Sangue, significa comungar seu desejo de alimentar a vida plena da humanidade. Assim, compreendemos que para verdadeira experiência eucarística, é necessário, que aqueles que comungam, ofertem a própria vida conforme o coração divino presente na Eucaristia. Não apenas receber a comunhão – não importando se foi recebida por meio da mão ou na boca – é necessário se tornar também comunhão. A Eucaristia é o princípio da comunhão na vida da Igreja e convoca a todos para a mesma missão em busca da unidade. O mundo com suas divisões ideológicas e culturais, não deve influenciar a caminhada da Igreja. Devemos acolher a todos, mas sem renunciarmos aos compromissos e exigências que a fidelidade ao Evangelho impõe.
Somos convidados a adorar o Senhor. Somos convidados a receber a Eucaristia e nos tornarmos também Eucaristia. Quando comungamos, nos tornamos sacrários vivos, onde Cristo se faz realmente presente em nós na Hóstia consagrada. Na procissão que realizamos depois da comunhão levamos o ostensório apresentando ao mundo nosso Salvador, no entanto não esqueçamos que na mesma procissão somos testemunhas vivas de sua presença pela Eucaristia que comungamos e pelo testemunho que damos na vivência da fé diariamente.
Hoje, quando o sacerdote depois de elevar sagrado Corpo e o sagrado Sangue, afirmar: “Eis o mistério da fé”; plenos de alegria, afirmemos com fé e coração eucarístico: “Todas as vezes que comemos deste pão e bebemos deste cálice, anunciamos, Senhor a vossa morte, enquanto esperamos vossa vinda.” Que nós, em nossa vida e missão, tenhamos certeza de que a Igreja nasce e vive da Eucaristia e que a Eucaristia realiza em nós, ainda aqui na terra, a comunhão que viveremos no céu com Deus que é: Pai, Filho e Espírito Santo.

Pe. Paulo Sérgio Silva
Diocese de




