“Quando se completou o tempo previsto, Deus enviou seu Filho, nascido de uma mulher...” (Gl. 4,4)
No ano de 1968, o Papa Paulo VI propôs que todos oshomens de boa vontade rezassem pela paz no mundo.Nascia assim ao lado da Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus, o Dia Mundial da Paz. Neste dia, pois, a liturgiaconvida-nos a contemplar a figura de Maria, mulher que ao ouvir o plano salvífico de Deus, deu à humanidadeJesus, o seu tão almejado libertador e maior de todas as bênçãos. E ao celebrar o primeiro dia do ano civil, as leituras ao trazerem como centrais as palavras “Bênção, Filiação e Salvação” nos ensinam que no início de uma caminhada será sempre necessário permanecer com asmãos dadas com o Deus que nos ama e deseja em cada dianos dar sua bênção e vida em plenitude.
A primeira leitura (Nm. 6,22-27), nos ensina que no Antigo Testamento a relação entre Deus e o ser humano era sempre intermediada, uma vez que a bênção divina só era concedida por meio de um mediador indicado pelo próprio Deus. Os sacerdotes eram os que exerciam a função de mediação. A fórmula aqui apresentada ficou conhecida como a Bênção de Aarão – que séculos mais tarde será amplamente usada e difundida no ocidente por São Francisco de Assis. A bênção apresentada em três proclamações revela três desejos essenciais do ser humano: Proteção, Perdão e Paz.
1ª A bênção protetora: “O Senhor te abençoe e te guarde!” (a necessidade de cuidado e proteção divina diante dos perigos causados pelo pecado). 2ª A bênção do perdão: “O Senhor faça brilhar sobre ti sua face e se compadeça de ti!” (o pecador é privado da face divina. Contemplar a face de Deus simboliza voltar a ter comunhão com ele e receber seu perdão). 3ª A bênção da paz: “O Senhor volte para ti seu rosto e te dê a paz!” (para os judeus, paz significa abundância de colheita e pagamento de todas as dívidas; o pecado se apresenta como uma dívida impagável que foi contraída pelo ser humano. Apesar disto, Deus não recusa ofertar sua paz).Recordando São Paulo que afirma que a partir da encarnação Jesus Cristo se torna o único e verdadeiro mediador entre Deus e a humanidade (porque une em si as duas naturezas: divina e humana), entendemos que de fato Jesus em sua paixão e ressurreição no protegeu, que todo aquele que viu o seu rosto contemplou o Pai (Jo. 14,7-14)e que em sua cruz, todas dívidas foram pagas e no chegou a Paz. Nele, em Jesus, a bênção que antes era pronunciada de forma imaterial, se tornou materializada, pois Ele é a manifestação encarnada da graça de Deus.
Na segunda leitura (Gl 4,4-7), a liturgia recorda que a encarnação é a revelação plena de Deus, que em seu amor enviou o seu Filho ao encontro da humanidade para os libertar da escravidão de tudo aquilo que os privava da vida em plenitude. Ao amar e obedecer irrestritamente a Deus Pai, Jesus segue sua vontade salvífica e ama toda a humanidade e assim nos ensina que longe da perdição, a vontade do Pai é nos oferecer uma nova e inesperada condição: a Filiação. Ao usar o termo “Abbá” (Papá,Papaizinho) – uma expressão utilizada pelo próprio Jesus e que denotava sua condição filial – Paulo expressa a novidade da fé cristã: uma relação muito íntima com Deus, semelhante à de uma criança com o seu pai e que revela a confiança absoluta, a entrega total e o amor sem limites.Assim entendemos que de fato e de verdade em Jesus somos herdeiros, e já não mais escravos. Com Ele, Nele e por Ele, o amor se torna a nossa lei!
O Evangelho (Lc 2,16-21) continua a cena que foidescrita e proclamada na noite de Natal: após o anúncio do “anjo do Senhor”, os pastores dirigiram-se a Belém e encontraram o menino, deitado numa manjedoura e rodeado por animais. Com tantos e diversos grupos sociais que constituíam a sociedade na vila de Belém, por que os pastores foram os primeiros a receber o anúncio da chegada da Salvação? Porque os pastores são a imagem de todos aqueles que era considerados desprovidos da graça de Deus. Eles eram analfabetos, logo não conheciam a Lei e o restante da Sagrada Escritura. Por estarem sempre sobrecarregados com os rebanhos, não conseguiam ir a sinagoga para ouvir a Palavra de Deus. Tudo isto os levava a ser considerados como sinônimos de pecadores por aqueles que se outorgavam o direito de posse sobre a salvação.
Todavia, eles, os pastores, apesar de desprezados e menosprezados pelos poderosos, reuniam em si as qualidades dos que esperavam ansiosamente pela salvação: os pobres, marginalizados e os profetas. Como os pobres, os pastores ao ouvirem atentamente o anúncio do anjo, demonstram estarem dispostos a acolher a boa Notícia do nascimento de Deus. E como os profetas, eles se alegram por receberem o anúncio, voltam glorificando a Deus ao verem no menino a concretização da promessa e,portanto, mesmo sendo analfabetos, ao anunciarem a chegada da salvação, se tornam anunciadores da Palavra de Deus.
Nas poucas linhas usadas para apresentar Maria, se entende que o evangelista a contempla como modelo de fé uma vez que ao proporcionar o nosso encontro com JesusCristo, ela demonstra sensibilidade ao plano salvífico de Deus. Conservar os fatos e as palavras em seu coração apresenta capacidade de sabe ler os sinais divinos na história bem como abertura para aceitar e acolher avontade divina na vida e disposição para colaborar de modo singular com Deus na realização da salvação para o mundo. Esta disponibilidade de coração para acolher a sua proposta é a primeira coisa que Deus pediu, pede e pediráa todos a quem Ele chama ao longo da história da salvação.
As duas atitudes apresentadas: a Meditativa/Contemplativa (Maria) e a Missionária (Pastores) definem as duas atitudes essenciais para os discípulos de Jesus Cristo. Todos nós somos igualmente chamados em nossa vocação de filhos de Deus, pelo Batismo que nos foi dado, a permanecer em atitude de abertura e acolhida da vontade divina e de ativa e servidora ação missionária. Somente assim permaneceremos ao longo do ano civil que se inicia com acerteza de caminharmos com Jesus Cristo cuja vida nos traz: Bênção, Filiação e Salvação.
Pe. Paulo Sérgio Silva.
Paróquia Nossa Senhora da Conceição – Farias Brito.