Solenidade da Santíssima Trindade: a família que se entrega ao amor gera a paz

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O ser de Deus, ou para a realidade cristã, a intimidade trinitária, inquieta em muito a curiosidade e a inteligência dalguns. Teólogos, sábios e entendidos têm ingente preocupação em expor e provar a possibilidade de “um só Deus em pessoas três”. Para que se possa intuir o que acontece no íntimo seio trinitário é preciso uma ponte que nos ligue de cá para lá. Jesus é essa ponte. Ele é o Sumo Pontífice (exatamente, a palavra vem de ponte). Santo Ambrósio, bispo de Milão, pediu ao imperador romano que não usasse mais este título, porque, de fato, apenas Cristo é esse elo entre céu e terra.

E, se se quer saber a maneira do Deus Uno e Trino se relacionar no interior da Trindade (ad intra), faz-se necessário ver o que o Nazareno revelou ao mundo (ad extra). “Deus amou tanto o mundo, que deu seu Filho unigênito, para que não morra todo o que nele crer, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16). Aqui temos um triplo movimento. Dois da parte da divindade e um por parte da humanidade, ou seja, Deus vive no amor e envia alguém muito importante para comunicar este amor, isto é, Ele deseja nos salvar, quer dizer, Seu intuito é nos fazer viver um infindável amor de comunhão, de partilha e de solidariedade entre nós e com Ele. Cabe ao ser humano, homem e mulher, responder a esse convite. Em outras palavra, é preciso crer em seu enviado, o Filho.

Viver o amor ainda no mundo porque Deus, nosso Pai, é amor. “Amemos uns aos outros, pois o amor vem de Deus e conhece a Deus. Quem não ama não conhece a Deus, já que Deus é amor” (1Jo 4,7s). O amor vive de entregas, nunca de reservas. É alteridade, não egoísmo. No outro encontra a sua satisfação, nele se realiza e para ele busca a felicidade. Só o amor é forte, como a morte (Ct 6,8). Por isso salva e liberta. Propõe-se, nunca se impõe. Permite a partida, porque sendo livre quer a liberdade de todos. Deus ama o Filho e lhe deu a humanidade como prova de seu amor. E, por amor, Jesus não perde esse presente. Mas tudo faz para guardá-lo, no amor do Pai.

A fé em Cristo (o nosso crer nele), porque assim é a fé de Cristo, acontece desde uma profunda experiência de amor. E temos sede de Deus devido à nossa efetiva e afetiva realização pessoal e comunitária ser condicionada a se dar a partir do amor. Este nos torna plenos. E toda possibilidade de se forjar a plenitude humana acontece desde um Grande Outro e de vários outros. Não existe comunhão com Deus quando inexiste comunidade humana. Crer no amor para que ele atinja a humanidade inteira.

O Amor gera vida. O mundo, na passagem do evangelho segundo João 3, 16-18, é a obra da criação saída das mãos de Deus. O mundo não é ruim, o que se faz no e do mundo, porém, é o que o torna ruim. Quando a humanidade não ama o mundo como o Pai o amou, ocorre a destruição, a degradação e o ecocídio. Jesus que recebeu do Pai o mundo, tem a responsabilidade de salvá-lo. E nesse sentido Deus entregou seu Filho ao mundo. O evangelho não descreve um Pai que se satisfaz em matar seu Filho para ter outros filhos. Isso é absurdo! A morte de Jesus é antes rejeição do desígnio de Deus por parte dos homens e das mulheres. Nisso, conforme a passagem evangélica acima, consiste o julgamento de Deus. Não é Deus que nos põe à direita (na salvação) ou à esquerda (na condenação), mas o fato de não crer e de rejeitar a prática e a força transformante desse amor (Jo 3,18). A encarnação do Filho é para gerar vida, e vida já aqui neste mundo, mas consumada na eternidade.

A vida foi gerada no amor para a salvação do mundo. Pelo Espírito Santo somos levados a conhecer o amor do Pai que, pelo Filho, gera vida a fim de nos salvar das seduções do mal no mundo. O Espírito provoca a permanência do amor do Pai. Ao amor que permanece chamamos paz de Cristo. Somente no Espírito de amor acontece a paz. Essa paz é o aperfeiçoamento do amor em nós. O Espírito nos concede suficientemente este amor, mas é preciso trabalhar eficientemente para que aconteça em e entre nós. O Espírito é o elo entre o amor do Pai e a vida do Filho. A síntese disso é aquilo que chamamos paz de Espírito. E, não obstante, o mundo se torna oposição a isso e ao próprio Deus não quando nos percebemos como pó da terra, parte do mundo, porém quando o subutilizamos em vista de necessidades materiais. Somos imanência, também transcendência. A família que se entrega ao amor, vindo de Deus, gera paz, realidade humana.

Por: Padre George de Brito, Sacerdote diocesano e Pároco do Sagrado coração de Jesus, em Crato; Especialista em Filosofia Hermenêutica e Mestre em Teologia Dogmática.

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