“Dei-vos o exemplo, para que façais a mesma coisa que eu fiz.” (Jo. 13,15)
Com a Missa vespertina da Ceia do Senhor, na Quinta-feira Santa, a Igreja inicia o Tríduo Pascal e faz memória da instituição do Sacramento da Eucaristia, da instituição do sacerdócio ministerial e do mandamento sobre a caridade fraterna. Esses três mistérios recordados são compreendidos e vividos à luz do lava-pés (Jo. 13,1-15) que é o centro do evangelho de hoje. O gesto do lava-pés significa o serviço e a caridade de Cristo, que veio “não para ser servido, mas para servir” (Mt.20,8). Notemos que a Liturgia Eucarística desta missa tem início com a procissão das oferendas que nos convida a ir ao altar levando os dons para repartir com os pobres. Assim, a entrega cotidiana da vida nos configura a Cristo e dá sentido à celebração da Eucaristia, ao Sacerdócio Ministerial e ao Mandamento Novo, evitando que o lava-pés se torne uma mera uma encenação teatral.
Na primeira leitura, (Ex. 12,1-8.11-14), ouvimos as orientações da ceia pascal judaica a qual era em essência uma ação de graças pelas ações salvadoras de Deus e ao mesmo tempo uma proclamação da esperança da verdadeira libertação. A celebração da Páscoa não era para o povo de Israel uma simples recordação do passado, mas era um caminho que os orientava para a libertação futura e definitiva, que aconteceria com a vinda do Messias. Não foi por acaso que Cristo escolheu instituir a sua Eucaristia durante a celebração da páscoa judaica. Assim a humanidade pode compreender que Jesus Cristo é o verdadeiro Cordeiro pascal. Assim como foi feito com as portas no A.T. nós somos marcados com o Seu sangue e somos alimentados com a Sua carne.
Na segunda leitura (1Cor. 11,23-26), escutamos o mais antigo relato sobre a instituição da Eucaristia. O Apóstolo Paulo afirma que a Ceia do Senhor (naquela época já celebrada pelas comunidades) é o memorial da Morte do Senhor e que deve ser celebrada até “que ele venha” no fim dos tempos. Através do texto paulino compreendemos que ao participar/comungar na Ceia realizada em memória do sacrifício de Cristo, as comunidades cristãs podem associar-se ao acontecimento/sacrifício do Calvário realizado de “uma vez para sempre”, mas atualizado em cada celebração eucarística.
Ao contrário dos outros evangelistas, São João (Jo. 13, 1-15) substituiu a narração da instituição da Eucaristia pela apresentação do gesto/ritual do Lava-pés. Por que ele fez isto? Porque para João, doar a própria vida foi o maior serviço realizado por Jesus. Deixar o seu Corpo e o seu Sangue para nos alimentar foi a perpetuação deste serviço. Logo Lava-pés e Eucaristia apresentam a mesma realidade. A Eucaristia – máxima expressão da doação de Jesus Cristo – é apresentada através de um gesto de caridade fraterna. Se na Páscoa do A.T. o povo sente Deus através da passagem de um anjo e se esconde com temor diante da presença divina, no N.T. o povo corre em direção a Deus, para ouvi-lo, vê-lo, tocá-lo. E Deus não foge do contato, lava os nossos pés e se entrega por inteiro no seu Corpo e no seu Sangue. Temos consciência de que quando recebemos a Eucaristia, podemos dizer: Hoje, comunguei do Corpo e Sangue de Deus?
Ele “Tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-se até o fim” e por isto, ajoelha-se e realiza o serviço do servo. Lava os nossos pés sujos, para que nos tornemos dignos de se sentar à sua mesa. A água que Ele usa é seu amor purificador. Nos sacramentos da purificação – o Batismo e a Confissão, Ele permanece ajoelhado diante dos nossos pés e realizando permanentemente este serviço.
“Vós estais limpos, mas não todos.” O que é que torna impuros? É a atitude de não se deixar amar e a recusa em amar ao próximo. Amar é servir. É a soberba que julga não necessitar de salvação e que rejeita à bondade de Deus. Contemplamos isto na atitude de Judas. Para ele, só o poder e o dinheiro são valorosos. Assim, ele decide que o dinheiro é mais importante do que a comunhão com Jesus. O seu egoísmo e a ganância o levaram a abandonar o caminho do Reino e o tornaram mentiroso e ambíguo. Por isto, com o lava-pés, o Senhor convida-nos a imitar a sua compaixão, a confiar na sua misericórdia. No seu serviço humilde, Ele nos chama, mesmo que estejamos perdidos, a retornar para casa e a permitir que a sua bondade purificadora nos reanime e nos faça entrar na comunhão da mesa com o próprio Deus. O gesto do lava-pés é uma proclamação do mandamento do amor realizada não com palavras, mas com uma atitude prática, o serviço ao irmão.
“Também vós vos deveis lavar os pés uns aos outros” (Jo. 13, 14); “Dei-vos exemplo…” (Jo. 13, 15). O que significa concretamente o ato de “lavar os pés uns aos outros”? Podemos dizer que qualquer obra de bondade, e especialmente por quem sofre, é um serviço de lava-pés. Significa estar disposto a perdoar incondicionalmente. Se recusar a dar e a receber o perdão, é recusar ter parte na comunhão com Cristo. Assim entendemos que para entrar em verdadeira comunhão com Deus, é necessário estar em comunhão com os irmãos e irmãs.
Celebremos, pois, estes santos mistérios pascais com piedade, espírito de adoração e profunda gratidão para com o Redentor que por nós morreu na cruz. Nesta celebração que recordamos a instituição da Eucaristia, peçamos ao Senhor, o Cordeiro de Deus, que seu Amor conceda a todos nós a graça de podermos ser, um dia e para sempre, convidados do Seu eterno banquete nupcial.
Pe. Paulo Sérgio Silva
Paróquia Nossa Senhora da Conceição – Farias Brito.




