A vida virtuosa de Maria é uma fonte inesgotável de riquezas, compreendidas por ações e gestos que apresentam a sua íntima relação com o Senhor, gerando frutos de salvação a todos aqueles que, olhando para o testemunho que Ela deixou, de docilidade e fidelidade, alcancem da mesma forma a graça da amizade de Deus. Porém, toda a herança de amor que nos foi deixada pela Mãe de Deus foi banhada no silêncio, não um silêncio que evoca uma ausência, mas uma zelosa presença.
Maria de Nazaré, como costumeiramente a apresentamos, é um silêncio desde as suas origens e seu destino; nas maiores fontes históricas de pesquisa, Nazaré não aparece, por exemplo: no Antigo Testamento, nos minuciosos escritos do historiador Flávio Josefo, em suas grandes obras Antiguidade Judaica e Guerra Judaica; como também, não aparece nos rigorosos mapas imperiais romanos, que se dedicavam a registrar até os lugares mais insignificantes de seus territórios conquistados; os únicos locais que se fala de Nazaré são nos Evangelhos. Quanto à data que Maria nasceu e a de seus pais, também não temos registro, apenas através da colaboração dos Evangelhos apócrifos é que somos assegurados que seus pais se chamavam Joaquim e Ana, contudo, nada consta nos canônicos, ou seja, tudo permanece no mais profundo silêncio.
Diante disso, não podemos afirmar, que este grandioso silêncio na vida de Maria gerava alguma alienação e passividade frente à propagação do Reino de Deus. Ora, por quem foram dadas as informações íntimas da infância de Jesus? É neste âmbito que encontramos Maria como missionária, uma mulher que soube identificar o tempo de Deus, e percebeu a hora exata para revelar as novidades guardadas no íntimo de sua vida, que durante todo o tempo não foi apenas um acúmulo de informações, mas que ela, ao passo que vivenciava a manifestação de Deus, procurava nos acontecimentos as razões e sentidos de tais gestos e palavras para confrontar com a realidade apresentada.
Quando nos deparamos com a indagação de quem era Maria, nos vem que ela é a Mãe de Jesus, porém, as primeiras comunidades a chamavam simplesmente de “A Mãe”, pois ela passou a ser Mãe não somente do Redentor, mas a de João, dos discípulos e de todos os que acreditavam no nome de Jesus; não foi justamente isto que foi dito do alto da Cruz (cf. Jo 19, 26-27)?
Com uma forte personalidade, distante de alguma alienação, Maria sempre foi ativa, questionou a proposta que fora realizada pelo Anjo (cf. Lc 1,34); foi rapidamente prestar auxílio a Isabel; quando perdeu o Menino, “moveu céus e terras” para encontrá-lo (cf. Lc 2,46); Em Caná, só ela estava atenta (cf. Jo 2,3); mas, compreendendo que em Deus tem que esperar, silenciou no Calvário, onde tudo e o Todo estava consumado, e como nada podia fazer, ficou quieta!
Mulher ativa na Igreja nascente, preocupada com o zelo da fé dos que abriam sua vida ao ponto de doá-la por amor a seu Filho. Nos é possível imaginar, com tão grande motivação, os discípulos foram enviados para as terras distantes; com quem, nas adversidades da vida, foram Pedro e João conversar e pedir conselhos e consolações. A Mãe sempre presente, para orientar e incentivar de pé os seus filhos, como estava também no calvário; presente ao enterrar Estevão, e nos encontros dos Apóstolos, fazendo ecoar aquelas mesmas palavras das bodas de Caná: “Fazei tudo o que ele vos disser” (cf. Jo 2,5).
Vemos que, da mesma forma que Jesus necessitou de Maria, em Belém, no Egito ou em Nazaré, para aprender a comer, andar, falar, a Igreja nascente precisou também de Maria. Não teria sido ela a aconselhar o preenchimento do vazio que Judas deixou? Aonde João iria buscar conselho? Ele não morava com ela? Não seria ela, portanto, a Conselheira, Consoladora, Animadora da Alma da Igreja que estava a se erguer? Por que então Maria não aparece de tal forma nos evangelhos? Ora, devemos recorrer ao contexto histórico em que foi escrito, basicamente uma sociedade patriarcal que havia um demasiado preconceito com a mulher, por isso não era bom para um escritor destacar a autonomia da mesma.
É por este caminho que podemos notar e entender o Sim que foi dado pela Mãe, as consequências desta missão divina, e a reação que foi exprimida nesta silenciosa alma, fazendo com que sua presença antes do nascimento do Salvador e após a sua ressurreição, fora de fundamental importância para a história da Salvação, tanto no que se diz respeito a Cristo, como a sua Igreja, que tem como herança, dada por Deus, o colo de uma Mãe atenta e vigilante para dar assistência aos seus filhos, e que sabe zelar pelo tempo de Deus.
Salve Maria!
LARRAÑAGA, Inácio. O Silêncio de Maria. Trad. José Carlos Correa Pedroso. São Paulo: Paulinas, 2012
Por Seminarista Cícero Cladson*





