RESTAURADOS, POR JESUS CRISTO, PARA UMA VIDA NOVA
“Eu quero: fica curado!” (Mc. 1,41)
Amados irmãos e amadas irmãs!
Ao longo destas semanas iniciais do Tempo comum estamos acompanhando Jesus, no início de sua vida pública e contemplando suas primeiras ações messiânicas. Se na semana passada o presenciamos curando numerosos doentes, hoje, o evangelista nos mostra Jesus entrando em contato a forma de doença mais grave da época: a lepra. Esta doença, por ser considerada um flagelo físico e espiritual, tornava sua vítima um marginalizado, uma vez que tornando-o impuro, o excluía de todo e qualquer relacionamento social. A Palavra proclamada neste Domingo apresenta-nos, pois, um Deus que convida com ternura e bondade a todos os seres humanos a fazer parte da comunidade. Ele não exclui ninguém nem aceita que, em seu nome, se inventem sistemas de exclusão dos irmãos.
A primeira leitura (Lv. 13,1-2.44-46) nos introduz ao livro do Levítico, que visa apresentar as normas relacionadas ao culto. O trecho que meditamos hoje faz parte da “lei da pureza”. Por meio dela conhecemos uma das inúmeras normas que na Lei do A.T. definiam a forma de tratar com os leprosos. Estas normas foram redigidas a partir das orientações do “dogma da retribuição” que professava que Deus distribuía as suas recompensas e os seus castigos conforme do comportamento do homem. Assim, a doença era sempre considerada um castigo de Deus aplicava diante dos pecados e infidelidades do ser humano. Sendo a lepra uma das doenças mais aterrorizantes, o leproso era considerado um pecador amaldiçoado por Deus e, portanto, um indigno que deveria ser excluído da comunidade do Povo de Deus. Assim compreendemos como, a partir de uma imagem errada de Deus, somos capazes de inventar modos de discriminação, de rejeição e exclusão em nome de Deus.
A segunda leitura (ICor. 10,31-11,1), continua nos introduzindo – como fez no domingo passado – na reflexão paulina sobre a polêmica sobre comer ou não as carnes que eram sacrificadas aos ídolos. São Paulo convida os cristãos a ser obediente as leis, mas a tendo como prioridade a glória de Deus e o serviço dos irmãos. Paulo, para evitar que os discípulos caíssem no legalismo escrupuloso dos judeus, afirma que “foi para liberdade que Cristo nos libertou” (Gl. 5,1). No entanto, esta liberdade deve ser exercida de modo que nos ajude a preservar três princípios: a glória de Deus, o Evangelho e o serviço aos irmãos. O exemplo essencial a ser imitado deve ser o de Cristo, que viveu na obediência incondicional aos planos do Pai e consumou sua vida em um dom de amor a serviço da restauração da dignidade da humanidade. Santo Ireneu de Lion (+202) dirá no início da era Patrística: “A glória de Deus é o homem vivo”. E de fato, Cristo, ao assumir nosso pecado, abriu mão da pureza externa para assim viver em plenitude a obediência ao Pai, redimindo o homem e com isto dando glória a Deus.
Em nossa sociedade pragmática e utilitarista, muitas vezes nos habituamos a uma catequese inteiramente baseada em doutrina e normas de conduta. E sem perceber, nos acostumamos a conhecer a fé exclusivamente por meio de conceitos. São Marcos, na construção de sua catequese não procede assim. O seu objetivo principal é anunciar que Jesus Cristo é o Filho de Deus. Em sua obra, ele realiza este anúncio em três momentos cruciais. No início (Mc. 1,1;11), no meio (Mc. 8,29) e no fim (Mc. 15,39). O homem leproso que surge suplicante diante de Jesus no Evangelho de hoje (Mc. 1,40-45) ainda que não pronuncie com os lábios a frase: “tu és o Filho de Deus”; ele realiza o anúncio pela verdade que crer veementemente no coração. As atitudes do homem leproso manifestam um verdadeiro testemunho de fé na graça e misericórdia de Deus. Suas palavras e gestos são uma profissão de fé na divindade de Jesus Cristo. Conforme já sabemos pelas sagradas escrituras, a lepra era um flagelo tão hediondo que era vista como um castigo divino. Sua cura somente poderia ser atestada como obra miraculosa do poder divino. Quando o homem se prostra, ajoelhado e suplica a Jesus a sua cura, ele o faz porque que crer que Jesus é verdadeiramente o Filho de Deus.
Deste modo, São Marcos nos revela, através da ação e missão de Jesus Cristo, o verdadeiro agir misericordioso de Deus. Assim como agiu outrora por meio dos profetas, no agora e em Jesus, Deus vem ao encontro da humanidade especialmente das vítimas da rejeição e da exclusão. Mediante a fé, Deus compadece-Se da miséria daqueles que são excluídos, estende-lhes a mão com ternura, liberta-os dos seus sofrimentos, restaura sua dignidade e os convida a integrar a comunidade do “Reino”. Diante da ação benevolente de Jesus, o homem curado e purificado da lepra se transforma em anunciador das maravilhas de Deus. O catequista/evangelista ensina-nos assim que quem experimenta o poder salvador de Jesus converte-se necessariamente em profeta e em testemunha do amor e da bondade de Deus. Ao enviar o homem para que testemunhe sua cura diante do sacerdote, Jesus converte o homem em anunciador do Reino. Se a cura de um leproso só podia ser realizada por Deus, era, portanto, um sinal messiânico. Um fato concreto que serviria para os líderes religiosos concluírem que o Messias tinha chegado e que o “Reino de Deus” já estava presente.
Às vezes podemos criar situações que levam a exclusão ao sofrimento, afirmando ser vontade de Deus. Um deus, severo e castigador, criado pelo desamor e amargura que pode habitar o coração humano. A atitude de Jesus Cristo é uma atitude de proximidade, de solidariedade, de aceitação. Como estamos agindo em nossas famílias e comunidade? Nossas atitudes são de acolhida e valorização do outro? Ou estamos contribuindo para manter as atitudes de exclusão e rejeição que causam divisão e dilaceram a Igreja e o Reino de Deus?
Já se aproxima a quarta-feira de Cinzas que abrirá para nós o tempo da Quaresma, tempo propício para o arrependimento e a conversão. E aqui aprendemos novamente com o homem leproso. Com toda a nossa coragem e sinceridade, devemos nos colocar diante do Senhor e, de joelhos, reconhecer a doença que nos acomete e pedir para ser curado. Esta atitude deve nos impelir, pois, neste tempo quaresmal, em direção ao Sacramento da Confissão. Pois, nela também nós ficamos inteiramente livres das nossas enfermidades. No sacramento da Reconciliação não ficamos apenas limpos do pecado, como adquirimos uma nova juventude, uma vez que recebemos a graça de renovar aquela vida nova que recebemos de Cristo no dia de nosso batismo.
Pe. Paulo Sérgio Silva
Diocese de Crato





