CHAMADOS E ESCOLHIDOS PARA A MISSÃO
“Avança para as águas mais profundas, e lançai vossas redes para a pesca.” (Lc 5,4)
A liturgia deste domingo nos convida a acompanhar Jesus, depois de ser batizado, nos primeiros passos de seu ministério redentor. À medida que ele vai adentrando na vida pública e na história humana, vai também convidando a humanidade a ter a coragem de avançar para as águas mais profundas do plano da salvação. Enquanto percorre o caminho da missão, Ele nos chama a ser colaboradores e refletir sobre a nossa vocação cristã tendo como modelo as vocações do profeta Isaías e dos apóstolos Pedro e Paulo. Os três ao discernirem o chamado de Deus sentem-se indignos de tão importante missão. Assim como eles, também nós nos sentimos desafiados e incapazes, todavia é preciso lembrar que Deus tem seus próprios critérios para chamar aqueles que escolheu para construir a barca da Igreja e permanecer lançando as redes da evangelização.
Na primeira leitura (Is 6,1-2a.3-8), encontramos a narração da vocação do profeta Isaías. Enquanto realiza um ato de adoração no Templo, Isaías se vê arrebatado e experimenta a presença onipotente de Deus, até então inacessível aos olhos humanos. Como tantos outros vocacionados, em sua humildade, o profeta sente-se indigno e impuro. Deus o purifica. E apesar do medo inicial, Isaías prontamente se oferece a Deus como instrumento. Responder a Deus significa deixar-se moldar por Ele em um caminho de purificação. E ao oferecer-se, mesmo sem saber ainda qual a missão que lhe vai ser confiada, o profeta manifesta a sua disponibilidade absoluta para o serviço de Deus. Assim compreendemos que cada um de nós, como batizados, temos uma vocação e que de muitas formas Deus entrou, entra ou entrará na nossa vida. E ao nos chamar para a missão, espera de nós disponibilidade e coragem para segui-lo.
Na segunda leitura (1Cor 15,1-11) o apóstolo Paulo ao refletir sobre a ressurreição nos revela a essência da vocação de todo discípulo: anunciar ao mundo o mistério do amor de Deus manifestado na vida e na ressurreição do seu Filho, Jesus Cristo. Ao descrever um esboço de uma profissão de fé, ele recorda que o Senhor ressuscitado se manifestou aos apóstolos e a muitos outros discípulos. Não se trata apenas de um fato histórico que ultrapassa a compreensão da razão, mas de um encontro com uma pessoa que mudou radicalmente a vida de todos que fizeram esta experiência. Através do encontro com o Senhor ressuscitado no caminho de Damasco, Saulo se deixou alcançar pela Graça de Deus e se tornou Paulo, o maior anunciador do Evangelho de todos os tempos.
No Evangelho (Lc 5,1-11), Lucas narra o crescimento da missão de Jesus. Se anteriormente Jesus realizava suas ações sozinho, agora junta-se a Ele, Pedro e seus companheiros pescadores. São muitos os elementos apresentados por Lucas em sua catequese narrativa: a terra, o lago/mar, o céu aberto, a multidão faminta da Palavra de Deus, as pessoas nomeadas, a pregação, o trabalho infrutífero, o fracasso, a presença do Filho de Deus na barca e na vida de um homem pecador, a escuta, a confiança, a obediência, a pesca abundante, o medo, a admiração, o tempo presente que anuncia já o tempo futuro e a decisão de deixar tudo que muda suas vidas.
Neste quadro narrativo, reconhecemos o caminho que os cristãos são chamados a percorrer. Compreendemos que para nos tornarmos instrumentos frutuosos nas mãos de Deus, uma condição se faz necessária: abertura para permanecer na escuta e na obediência, para seguir com generosidade e disponibilidade, a Palavra do Senhor. Assim como aconteceu com Isaías e talvez com Paulo, Pedro, ante o cansaço e desânimo, levanta uma objeção inicial diante do pedido para lançar as redes depois de uma noite de pesca infrutífera, e depois da milagrosa pesca fez o pedido para que Jesus se afastasse devido a sua indignidade. Como ele, esquecemos que muitas vezes acontecerá de a Palavra não estar conforme os nossos planos e vontades. Conscientes de nossas fragilidades, debilidades e pecados, todos nos sentimos inadequados ou inapropriados para colaborar no Reino. Todavia, lembremos que Deus é mais íntimo a nós que nós mesmos (Santo Agostinho, Confissões, III, 6, 11), logo, Ele não julga nem chama baseado na aparência (1Sm 16,7). Se a Graça nos chamou, provavelmente o fez por seus divinos motivos que muitas vezes são incompreensíveis para nós. Permaneceremos errados se recusarmos o chamado para evangelizar e também enganados se decidirmos agir baseados apenas em nossas categorias avaliativas! É justo e necessário antes de tudo obedecer à Palavra de Deus.
O Senhor Jesus, um dia no alvorecer, adentrou na vida de Pedro e anunciou a chegada definitiva do tempo da graça. E ainda hoje ele continua utilizando-se da barca de Pedro para anunciar sua Palavra e ir ao encontro da humanidade. Um dia nós fomos “pescados” pelas redes do Evangelho lançadas por Pedro e seus sucessores. E uma vez pescados, chega a nossa vez de subir a barca, ouvir também a voz divina que clama para adentrar nas águas profunda e desafiadoras, e lançar as redes, confiantes e obedientes.
Nas águas profundas do mar da nossa vida e da missão da Igreja encontramos muitos desafios: guerras, ideologias, violências, imoralidades, perseguição, mentiras anunciadas como verdade (fake news), divulgação de falsas doutrinas, fome, indiferenças ante o sofrimento, etc. Perante tais ameaças, não podemos desistir, ficar indiferentes ou acomodados. Fomos chamados a ser “pescadores de homens”, temos por missão combater o mal, a injustiça, o egoísmo, a miséria, isto é, tudo o que impede a humanidade de viver com dignidade, paz e felicidade.
Rezemos para que em cada missa, alimentados com e pela Eucaristia, com a Palavra de Deus que a Santa Igreja proclama e com a oração, para que como comunidade cristã nos sintamos convidados a realizar uma intensa experiência de Deus e permaneçamos colaborando na missão salvadora e libertadora de Jesus Cristo.

Pe. Paulo Sergio Silva
Diocese de Crato.




