JESUS: NOSSA RESSURREIÇÃO E NOSSA VIDA
“Eu Sou a Ressurreição e a Vida. Quem crê em mim, mesmo que morra, viverá.” (Jo. 11, 25
Eis que chegamos ao 5º domingo da Quaresma. A cidade de Jerusalém já se apresenta ante nossos olhos e coração. Estamos nos aproximando da Semana Santa e os temas quaresmais cada vez mais buscam nos introduzir na espiritualidade do mistério pascal de Cristo. Sendo assim, nestas três últimas semanas a liturgia foi cadencialmente apresentando elementos ou símbolos do Batismo: a Água com a Samaritana, a Luz como o cego de nascença e agora o Espírito Santo que dá a vida com a ressurreição de Lázaro. E assim a Palavra nos revela que a vontade de Deus é nos oferecer uma vida plena que ultrapassa definitivamente os limites da vida biológica. É a vida que supera a morte. Vida que nasce no e do Batismo e que será alcançada através da ressurreição de Jesus Cristo.
Na primeira leitura (Ez. 37,12-14), somos apresentados a um dos oráculos do profeta Ezequiel, profeta chamado a alimentar a esperança do povo de Israel em meio a grande crise de fé causada pelos pecados que resultaram no Exílio da Babilônia. Escravizados numa terra estrangeira, sem Templo, sacerdócio e celebrações cultuais, os exilados estão desesperados e voltam a duvidar da bondade e do amor de Deus como fizeram outrora no deserto. O desespero no qual estão mergulhados os exilados é uma situação de morte. Ausentes da Terra Prometida, eles sentem que estão próximos à ruína e ao aniquilamento. Assim não enxergam qualquer perspectiva de futuro no horizonte. Não é à toa que a palavra “túmulo” surge três vezes no texto.
Através da voz de Ezequiel, Deus anuncia um novo “êxodo”. O povo que sofre quebrado e espalhado pelo mundo como os ossos da visão do profeta, será reconduzido à sua própria terra, onde habitará com segurança, pois Deus infundirá em seu Povo o seu Espírito vivificador e eles voltarão a se erguer das cinzas do exílio, recriados como pessoas novas. De modo semelhante ao ato da criação (Gn. 1,26 / Gn. 2,7) esta vida divina os transformará completamente fazendo-os passar de uma vida egoísta com corações de pedra a humanos verdadeiros com corações de carne, sensíveis, bons e capazes de amar Deus e os irmãos. Aquilo que foi profetizado por Ezequiel em imagens e visões foi realizado plenamente por Jesus em seu amigo Lázaro.
Na segunda leitura (Rm. 8,8-11) Paulo escreve à comunidade cristã da cidade de Roma apresentando de forma serena e pedagógica o que é essencial para o anúncio do Evangelho. Como está se dirigindo a uma comunidade que foi influenciada pela cultura grega, o Apóstolo utiliza analogias, antíteses e comparações comuns ao pensamento de Platão e de seu característico dualismo. Ao usar as imagens da “carne” e do “espírito”, ele deseja afirmar que todo ser humano possui dentro de si duas inclinações que lutam em nosso coração. A vida sob o domínio da carne significa o ato de viver conduzido pelos instintos egoístas que produzem o pecado. A vida marcada pelo Espírito é a vida dos que foram regenerados por Jesus Cristo, justificados pela Graça e tornados novas criaturas, participantes de sua natureza divina.
Todavia receber o Espírito Santo não significa ter a liberdade anulada. Paulo informa então que os cristãos não podem viver segundo a carne e segundo o Espírito ao mesmo tempo. Por isto, viver a santidade, isto é, pensar e agir como Cristo deve ser uma opção permanente na vida dos discípulos. No dia do seu Batismo, os cristãos optaram por Cristo e pela vida nova que Ele veio oferecer. Com isto, somos chamados a ser coerentes com essa escolha, ou seja, a realizar a edificação do Reino de Deus e a viver “segundo o Espírito”.
No Evangelho (Jo 11,1-45) somos apresentados ao último sinal que João utiliza para revelar a identidade e a missão de Jesus Cristo. Em meio ao “livro dos Sinais” ele também nos apresentou elementos ou símbolos do Batismo: a Água com a Samaritana, a Luz como o Cego de nascença e agora o Espírito Santo com a ressurreição de Lázaro. Qual a sua intenção? Apresentar Jesus como doador da vida plena através da ressurreição que é incorporada a comunidade por meio do Batismo.
A cena narrada nos transporta para uma pequena aldeia onde Jesus visita uma família de amigos que vivenciam o momento mais comum e triste para toda a humanidade: a doença e a morte de um ente querido. O texto tem o cuidado de revelar a humana solidariedade de Jesus através da amizade que o une aos três irmãos. Este vínculo é tão forte que diante do sofrimento enfrentado pela família, Jesus sente uma profunda comoção que o leva às lágrimas.
Na crença judaica a morte era considerada irreversível a partir do terceiro dia. Jesus chega a Betânia depois do quarto dia do sepultamento de Lázaro. O texto nos ensina então que Jesus não elimina a morte física, mas possui domínio sobre ela. Usando uma metáfora, Jesus compara a morte ao sono e afirma que veio ao mundo para despertar a humanidade desse sono. Quem se torna amigo de Jesus, enfrenta a morte física como um sono, do qual acorda para a vida definitiva. E Lázaro, se torna o símbolo dos que morrem na amizade de Deus. Os amigos de Jesus experimentam a morte física como uma passagem para a vida eterna.
Três personagens são apresentados representando diferentes modos de ir ao encontro de Jesus: Marta: é a primeira pessoa a ir ao encontro de Jesus. Se dirige a Ele utilizando-se de títulos que expressam, na verdade, uma profissão de fé: “Senhor” e “Filho de Deus”. Diante da promessa que Jesus lhe faz ela pronuncia sua profissão de fé e corre ao encontro de Maria para lhe anunciar a novidade. Chama atenção o fato de Marta ser usada como símbolo de fé na ressurreição uma vez que ela em outra passagem foi mostrada como alguém mergulhada em um hipotético ativismo que a impedia de sentar-se aos pés de Jesus para aprender suas palavras. Marta representa as pessoas cuja fé genuína em Jesus Cristo, o Filho de Deus, Salvador da humanidade as leva a transpor os limites da racionalidade e acreditar no impossível. Maria: ela vai ao encontro de Jesus, todavia, devido ao peso do luto, não consegue professar a fé de modo semelhante à irmã. Os Judeus que prestam condolências: como pessoas que não fizeram a experiência do encontro pessoal com o Cristo, eles apenas seguem Maria, mas são incapazes de expressar qualquer sinal de fé.
O momento da oração de Jesus diante do túmulo revela sua permanente comunhão com Deus Pai e com o Espírito Santo. Através de sua súplica, Jesus conduz os discípulos à verdadeira fé e mostra a todos que Deus amou de tal modo o homem que enviou o seu único Filho para dar a vida a todos. Assim sua oração constitui um testemunho vivo da presença de Deus. Aquele mesmo Deus que ouviu o sofrimento do seu povo no Egito, agora através do seu Filho, o Cristo Senhor, manifesta sua solidariedade a todos os que sofrem e ao mesmo tempo, se identifica como Ressurreição e Vida. Embora não seja mencionado, o Espírito Santo se faz presente, pois é Ele que realiza a ressurreição de Lázaro do mesmo modo que realizará a do próprio Jesus Cristo (Cf: Rm. 8,11).
Como a pedra que selava o túmulo de Lázaro, todos nós possuímos situações que nos impedem de viver a vida definitiva alcançada pela ressurreição de Cristo e dada a nós pelo Batismo. A pedra do rancor, da mágoa, da falta de fé, do ódio, da inveja, as pedras das nossas culpas, que carregamos sobre nossos ombros e corações como pesados fardos (Cf: Mt. 11,28-30; Mt. 23, 3-4). No entanto, assim como ordenou a Lázaro, Ele também nos ordena a sair do túmulo dos nossos pecados. É preciso escutar então a sua Palavra e sair. Sair do nosso comodismo que nos impede de servir; sair do túmulo da indiferença que nos impede de vir ao encontro dos que sofrem.
Nos nossos últimos passos desta peregrinação quaresmal, como Marta em sua profissão de fé, supliquemos ao Senhor que sua Palavra remova a imensa pedra/pecados que como uma barreira pode nos impedir de crescer na fé e de viver a vida plena que traz a felicidade e a paz permanente.
Pe. Paulo Sérgio Silva
Paróquia Nossa Senhora da Conceição – Farias Brito.