CAMINHEMOS EM DIREÇÃO A CRUZ ILUMINADOS PELA LUZ DE CRISTO
“Deus amou tanto o mundo, que deu seu Filho Unigênito, para que não morra todo o que Nele crer, mas tenha a vida eterna.” (Jo. 3,16)
Até onde pode ir o amor de Deus para nos resgatar e salvar? Com o diálogo catequético realizado diante de Nicodemos, Jesus Cristo, nos revela que Deus nos oferece, de forma totalmente gratuita e incondicional, a vida eterna, sendo capaz de oferecer o próprio Filho para realizar o seu plano salvador. A salvação é gratuita, mas deve ser livremente acolhida por todos e cada um. Neste domingo “Laetare”, pois acolhamos com alegria o senhor que vem ao nosso encontro.
Na primeira leitura (2Cr. 36,14-16.19-23), o Livro das Crônicas, em um breve resumo da história de Israel, aponta todo um caminho de menosprezo pela solicitude de Deus e que culmina em uma nova era de escravidão e desta vez no império da Babilônia. Ao relatar as ações e pecados que levaram o povo de Israel a se tornar novamente escravo, nos ensina que quando o homem abandona a Deus e escolhe caminhos de egoísmo e desobediência, acaba construindo para si um futuro de dor, desolação e de morte. No entanto, ao utilizar Ciro, rei da Pérsia, um rei pagão para libertar e devolver o povo a Terra Prometida, sua divina Palavra nos informa que sua misericórdia sempre nos oferece oportunidade de recomeçar, de refazer o caminho da esperança e da vida nova. Ainda que o “dogma da Retribuição[1]” – que aparece de modo implícito – cometa o grave erro de querer atribuir o exílio babilônico a um pagamento de Deus pelos maus atos do povo eleito, podemos perceber algo verdadeiro na narrativa e que nós mesmos muitas vezes comprovamos na prática de nossa vida diária: assim como aconteceu com o povo eleito, as nossas escolhas erradas cedo ou tarde trazem infelicidade, desgosto e sofrimento para nós e para aqueles que caminham conosco. A ação de Ciro demonstra uma nova oportunidade oferecida por Deus e que o povo precisa acolher com alegria e esperança.
Na segunda leitura (Ef. 2,4-10), São Paulo recorda aos cristãos de Éfeso – e a nós também – que Deus nos ama com um amor incansável e inesgotável. É esse amor que não se cansa de levantar a humanidade da sua condição de finitude e debilidade e que lhe oferece “a incomparável riqueza da sua graça” por meio da Encarnação, Paixão, Morte e Ressurreição do seu bem mais precioso, o seu Filho Unigênito. É preciso sempre recordar que a salvação não é uma conquista alcançada por cada um e tão pouco uma propriedade que temos direito de exclusividade por causa de nossos méritos. A redenção é fruto da pura gratuidade de Deus para todos e a cada um. Ela, a salvação, é oferecida integralmente por este Deus de infinita misericórdia que espera pacientemente o tempo em que cada filho esteja disposto e livre para acolhê-la, não importando para Ele se este momento acontece no dia do nascimento ou mesmo depois de percorrer dolorosamente o caminho do filho pródigo (Lc. 15,11-32) ou do ladrão arrependido (Lc. 23,39-43).
No Evangelho (Jo. 3,14-21), em diálogo fraterno com Nicodemos, Jesus dá continuidade ao que São Paulo afirmou na segunda leitura e nos responde a pergunta realizada no início desta reflexão: Ele nos recorda que Deus Pai nos amou com amor tão imensurável que “deu o seu Filho unigênito” para nos oferecer a vida eterna. Neste tempo que vivenciamos a Quaresma e Campanha da Fraternidade, somos convidados a contemplar as palavras e ações de Jesus, e como Nicodemos, a aprender com Ele a lição do amor total, percorrendo com Ele o caminho da cruz que se transforma em dom da vida. É esse o caminho da salvação, da vida plena e definitiva. Nicodemos passou boa parte da missão de Jesus em uma atitude de indecisão e relutância. No entanto, Jesus insistiu e não desistiu dele porque enxergava a integridade do seu coração. Tanto que lhe oferece uma oportunidade que poucos tiveram o privilégio: um diálogo pessoal com o Senhor. No momento de maior amor de Deus – a doação da vida na cruz – Nicodemos, ao descer o corpo de Cristo da Cruz e lhe dar sepultura, expressa sua decisão finalmente: ele é um Discípulo. (Jo. 19 ,38-42)
Nicodemos passou boa parte da missão de Jesus, vivendo uma indecisão de se tornar discípulo ou não. Todavia, com um gesto concreto, Nicodemos assume diante da sociedade a sua fé e seu discipulado. Nos apressemos, pois, com a nossa decisão vital. O quanto antes nos decidimos pelo discipulado, mais poderemos usufruir da presença do Senhor em nossa vida como Nicodemos naquela noite transformadora. Assim aprendemos que mesmo que às vezes, abandonemos os caminhos divinos ou fiquemos indecisos em lhe obedecer, Deus permanece nos buscando com gestos concretos de paciência, amor e misericórdia. No entanto, é imperativo que em nossa vida, como Nicodemos, cedo ou tarde, tomemos uma decisão categórica de acolher a luz que emana da vontade de Deus e a viver definitivamente aquilo que já nos tornamos pelo Batismo que nos foi dado: Discípulos Missionários de Jesus Cristo, Filho Unigênito de Deus e nosso Mestre e Redentor.
Pe. Paulo Sérgio Silva
Diocese de Crato.

[1] Dogma da retribuição. Os catequistas de Israel (teólogos que redigiram os textos sagrados), mediante este conceito, apresentam Deus como uma espécie de contador sempre atento e pronto a anotar no seu livro divino os bons e maus atos do ser humano. E então Ele retribui conforme as ações praticadas. Se vivem na fidelidade à Aliança e aos mandamentos, Deus oferece-lhe vida e felicidade. Em contrapartida, se o Povo é infiel aos compromissos assumidos, recebe em pagamento morte e desgraça.





