HOMILIA DO 15º DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO A

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O REINO É O EVANGELHO PLANTADO EM NOSSOS CORAÇÕES

Em verdade vos digo, muitos profetas e justos desejaram ver o que vedes, e não viram, desejaram ouvir o que ouvis, e não ouviram.” (Mt. 13,17)

A liturgia do 15º Domingo traz um forte apelo para que o ser humano acolha a Palavra e se deixe transformar por ela. Todos os textos nos trazem a imagem do Reino como uma realidade misteriosa, suscinta e discreta, mas com uma inexplicável força transformadora. Ao ser humano cabe a decisão de acolher esta proposta realizada por Jesus Cristo e se deixar transformar igualmente por ela.

A primeira leitura (Is. 55,10-11) nos coloca diante de Isaías exercendo sua missão profética junto ao desolado povo de Israel em meio ao exílio da Babilônia. Israel é a imagem de toda a humanidade e, portanto, assim como acontece conosco, Israel tem a memória fraca quando se trata de lembrar dos próprios erros. Apesar de ter abandonado livremente a Aliança, o povo eleito se encontra decepcionado com a fé e esta desilusão o leva a culpar a Deus acusando-o injustamente de infidelidade. Os versículos que meditamos fazem parte do chamado “livro da consolação”, obra na qual o profeta proclama a libertação do cativeiro babilônico e o início de um novo êxodo.

Mesmo que o povo esteja cansado dos oráculos repletos de esperança, o profeta não desiste. A Palavra de Deus nunca falha. Mesmo que demore, ela permanece eficaz, transformadora, geradora de vida. Por isto, Isaías utiliza a imagem da chuva e da neve, porque assim elas fecundam e geram vida na natureza, a Palavra, de modo misterioso e imperceptível, acabará por produzir vida em abundância para o Povo Eleito.

A segunda leitura (Rm. 8,18-23) depois de apresentar os dois caminhos que devem ser discernidos e escolhidos pelo ser humano – a vida segundo a carne e segundo o Espírito – São Paulo revela que a renovação da criação depende também desta escolha humana. Para o Apóstolo, o pecado do homem contaminou a criação com a desordem. No entanto, à medida que o homem acolhe a redenção dada por Cristo e deixa para trás os grilhões da morte, toda a criação recupera o seu propósito original, se transforma no novo céu e na nova terra, frutos da redenção.  Antes que se diga que esta afirmação se trata de uma inovação forçada para querer unir teologia com ecologia, este tema sobre a solidariedade do ser humano para com o restante da criação surge inclusive em vários outros momentos da Bíblia tanto no Antigo quanto no Novo Testamento (Cf: Gn. 9,12-13; Cl. 1,20; 2Pe. 3,13; Ap. 21,1-15).

 Ao longo das semanas anteriores acompanhamos Jesus escolhendo os discípulos, os preparando catequeticamente para anunciar e viver os valores do Reino e depois os enviando em missão para anunciar a chegada da salvação. Os discípulos retornam da missão e muitos expressam a insatisfação diante da rejeição que sofreram principalmente nas grandes cidades e povoados. O Evangelho (Mt. 13,1-23) que meditamos hoje se trata do momento no qual Jesus ouve as impressões dos discípulos e suas frustrações sobre as dificuldades da missão. Diante da crise de fé causada pelas inseguranças dos seguidores, Cristo lhes narra a parábola do Semeador e da Semente.

 Para início de conversa, a parábola é uma reflexão sobre a forma como acolhemos a Palavra anunciada e uma exortação para nos tornarmos boa terra onde a semente irá crescer e dar frutos, isto é, devemos conservar o coração disponível para escutar as propostas de Jesus, as acolher e para deixar que os valores do Reino dêem abundantes frutos na nossa vida de cada dia.

Sabemos que as parábolas são a expressão da pedagogia e didática singular de Jesus Cristo. Ele falava do Reino com imagens tiradas da natureza e das situações da vida diária do povo. No entanto, por serem simples e cheias de figuras, as parábolas somente poderiam ser compreendidas por quem tivesse um coração humilde e bom, ou seja, os “pequeninos” mencionados no domingo passado.

Para nós, pode parecer estranho um semeador ter tanta desatenção enquanto realiza o seu trabalho. Por que ele não percebe as sementes caindo em lugares inapropriados? Por que ele não retorna para recolher as sementes em meio aos espinhos e pedras? Os fatos narrados na parábola indicam, na verdade, as técnicas agrícolas usadas na Palestina daquela época: primeiro, o agricultor lançava a semente à terra; depois, é que passava o arado o terreno. Assim, compreende-se porque uma parte da semente caiu à beira do caminho, outra em lugares pedregosos onde não havia muita terra e outra entre os espinhos. Isto acontecia porque a semeadura ou plantio não era realizado depois que a terra estava aradada, mas antes.

Esta imagem revela a pedagogia do Reino dos Céus. O Evangelho é anunciado a todos os corações independentemente de eles estarem dispostos a acolhê-lo ou não. O acolhimento do Evangelho não depende, nem da semente, nem de quem semeia; mas depende da qualidade da terra. Com o tempo, respeitando a liberdade humana, a graça faz frutificar o que foi anunciado a partir da acolhida que foi dada pelo coração humano. Por meio desta imagem a realidade do Reino é revelada como uma força transformadora e imparável, uma vez que mesmo sofrendo rejeições por causa dos valores opostos que tomam conta do coração humano, ainda que demore, ele, o Reino, cedo ou tarde manifestará em todo o seu vigor, esplendor e abundância a vida de Deus.

Se no tempo de Jesus Cristo haviam muitos valores que rivalizavam com a Graça e com os valores do Reino, no nosso “hoje”, as dificuldades superabundam uma vez que os projetos mundanos se multiplicaram como ervas daninhas ou insetos devoradores. Muitos sãos os valores perversos que desejam devorar o coração o humano. Todos nós, no fundo, queremos ser um terreno bom, onde a Palavra de Deus possa dar muitos frutos, no entanto nem sempre estamos dispostos a renunciar nossas ambições para deixar o coração disponível para Deus.  Se o semeador é Jesus e a semente é a Palavra, obviamente que o terreno somos nós. Eis aqui a nossa grande responsabilidade: fazer com que o nosso coração permaneça uma terra boa!  Nós seremos o terreno bom na medida em que tivermos a capacidade de nos deixar transformar pelo Evangelho, de acolher e viver os seus valores. Resumindo numa frase: a capacidade de nos converter.

A parábola do Semeador e da Semente permanecerá sendo uma exortação não apenas aos cristãos, mas a toda a humanidade, para acolher a Palavra de Jesus, sem deixar que os problemas cotidianos, as adversidades da vida, os valores mundanos e egocêntricos impeçam o Evangelho de frutificar e tornem a semente da Palavra uma semente estéril, sem vida.

Pe. Paulo Sérgio Silva

Paróquia Nossa Senhora da Conceição.

 

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