Formação: Cristo, fonte e modelo das relações entre os casais

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São João Paulo II em suas catequeses sobre o corpo humano ensina que toda pessoa humana é chamada a fazer de si mesma um dom sincero ao outro (CATEQUESE 15). É no dar-se ao outro que a pessoa humana melhor imita o seu Criador, alcança sua maturidade e aperfeiçoa-se no amor, fazendo-se um “dom sincero”, total, fiel, exclusivo e indissolúvel do mistério de Deus.

No livro do Gênesis, o primeiro homem exerce o seu “senhorio” sobre toda a criação, nomeando todos os animais, mas nenhum destes pode corresponder aos seus anseios, exulta de alegria perante o encontro com a primeira mulher. Ele, o primeiro homem, sai do seu “eu” para então encontrar-se com o outro “eu” e, desta maneira, estabelecer a comunidade primeva [primeira]: o matrimônio, que é base da família e da sociedade.

Estabelecendo uma comunidade frutífera com a primeira mulher, o homem responde à sua vocação de ser “imagem e semelhança” de Deus, povoando a terra, dominando a criação e participando dela com seu Criador. Ao final dos textos sagrados, especificamente no livro do Apocalipse, contempla-se o matrimônio que é elevado à plenitude dos tempos: a Jerusalém Celestial, adornada como uma noiva para encontrar-se com o seu Esposo.

São João Paulo II afirma que “[…] As relações recíprocas do marido e da mulher devem brotar da comum relação de ambos com Cristo […]” (CATEQUESE 89§1). Tal como Cristo se une à Igreja e se faz um só corpo com ela para redimi-la e assumi-la para Si, os esposos assumem um estado de vida que os torna “uma só carne”, para que ambos se santifiquem diariamente e que cada um se torne responsável pela salvação de seu cônjuge.

Na carta aos Efésios, o apóstolo São Paulo desenvolve uma teologia sacramental do matrimônio para manifestar sua sacralidade e indissolubilidade perante tão grande mistério, dizendo:

E vós maridos, amai as vossas mulheres, como Cristo amou a Igreja e se entregou por ela, a fim de purificá-la como o banho da água e santificá-la pela Palavra, para apresentar a si mesmo a Igreja, gloriosa, sem mancha nem ruga, ou coisa semelhante, mas santa e irrepreensível. Assim também os maridos devem amar suas próprias mulheres, como a seus próprios corpos. Quem ama suas mulher ama-se a si mesmo, pois ninguém jamais quis mal à sua própria carne, antes alimenta-a e dela cuida, como também faz Cristo com a Igreja, porque somos membros do seu Corpo. Por isso deixará o homem seu pai e sua mãe e se ligará à sua mulher, e serão ambos uma só carne. É grande este mistério: refiro-me à relação entre Cristo e sua Igreja. Em resumo, cada um de vós ame a sua mulher como a si mesmo e a mulher respeite o seu marido. (Ef 5, 25–33).

O autor sagrado tem a finalidade de mostrar que a união de Cristo e da Igreja é a fonte e o modelo unitivo entre os esposos, uma união de caráter profundo e maduro. A relação esponsal que une os cônjuges deve – de acordo com a carta aos Efésios – ajudar a compreender o amor que une Cristo à Igreja, um amor recíproco em que se realiza o eterno plano Divino da salvação do homem.

O Catecismo da Igreja Católica afirma que o amor é a vocação fundamental e inata de todo ser humano (n. 1604).  Tendo Deus criado o homem e a mulher, seu amor mútuo se torna uma imagem de amor absoluto e indefectível, numa unidade de vidas, de modo que já não são dois, mas “uma só carne” (Mt 19, 6). Por meio do sacramento do matrimônio, o homem e a mulher constituem entre si a primeira comunidade de pessoas humanas, refletindo mais perfeitamente a “imagem e semelhança” de Seu Criador. Qualquer pessoa humana, como afirma o teólogo e escritor suíço Hans Urs Von Balthasar, “[…] que deseja algo de definitivo na vida, seja um amor ou uma realização, tem de entregar-se a si mesma. Tem de pagar consigo mesma aquilo que deseja adquirir […]” (2017, p. 15), ou seja, mesmo que deseje expressar a si mesma, da forma mais intensa quanto possível, terá que abandonar-se inteiramente pelo bem e pelo amor.

Portanto, a vivência sacramental do matrimônio é exigente, necessitando de uma imensa disposição e seriedade, para que o esposo e a esposa sejam sinceros em seus esforços a fim de que o amor conjugal não seja diluído pelos desafios que são naturais da vida matrimonial. Somente a graça de Deus, comunicada pelo sacramento do matrimônio, pode sustentar e amadurecer o amor de ambos, conservando a fidelidade e rejeitando qualquer tipo de adultério.

O sentido esponsal do corpo consiste em expressar o amor conjugal e não a individualidade egoísta que se faz presente na vida matrimonial. O testemunho desse amor deve ser capaz de acolher e de corresponder ao amor do próximo como dom e realização do sentido da existência na vida matrimonial. Esta relação – que é natural e estabelecida pelo Criador – desde o princípio quando os constituiu para serem uma só carne no amor, ganha sua plenitude em Cristo, que se faz Esposo da humanidade. A relação entre Cristo-Esposo e a Igreja-Esposa é, segundo São Paulo (Ef 5, 21ss), o ícone da vida matrimonial redimida e ressignificada em Sua Pessoa.

REFERÊNCIAS

BÍBLIA DE JERUSALÉM. São Pulo: Paulus, 2002.

BALTHASAR, Hans Urs Von. Vida a Partir da Morte: meditações sobre o mistério pascal. Trad. Ney Vasconcelos de Carvalho. São Paulo: Paulus, 2007.

CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. Petrópolis, São Paulo: Edições Loyola, 2000.

JOÃO PAULO II, Papa. Teologia do Corpo: o amor humano no plano divino. 1ª ed. São Paulo: Ecclesiae, 2014.

Seminarista Adolfo Lima, 4º ano de Teologia

 

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