FESTA DA TRANSFIGURAÇÃO DO SENHOR – ANO B

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TRANSFIGURADOS COM CRISTO, POR CRISTO E EM CRISTO

Este é o meu filho amado, no qual eu pus todo o meu agrado. Escutai-o!” (Mt. 17,5)

Iniciamos o mês de agosto com a participação em um momento de privilegiada intimidade com Deus: A Transfiguração de Senhor.  Se toda vocação é um chamado para seguir a Jesus Cristo, somente que fez a experiência de conhecer quem é Jesus e qual a sua missão será capaz de responder fielmente e permanecer corajosamente nesta resposta. Deste modo, ao longo deste mês somos convidados a viver a mística do Mês Vocacional onde somos exortados a rezar pela riqueza espiritual das inúmeras vocações suscitadas pelo Espírito Santo no coração da Igreja. Como Pedro, Tiago e João contemplemos a Jesus: Ele é divino e é nosso irmão. Ele é o Filho amado, Ele é o nosso Deus Salvador!

A primeira leitura (Dn. 7,9-10.13-14) nos coloca diante de Daniel, um profeta que exorta o Povo Eleito a permanecer fiel a Aliança mesmo diante da perseguição e opressão promovida pelo Rei Antíoco Epífanes que deseja impor a cultura grega sobre o povo de Israel. Assim, somos introduzidos a uma visão gloriosa e misteriosa que no Novo Testamento servirá de inspiração para o livro do Apocalipse e tem como intenção transmitir a esperança aos perseguidos por causa da sua fé e exortá-los a manter os seus valores tradicionais da Aliança. O “Ancião” visto pelo profeta sentado em um trono é o próprio Deus. Ele está cercado por seus anjos, os realizadores das intervenções divinas na história. Quando os livros, nos quais são registradas as ações das pessoas, são abertos: começa-se o julgamento e um misterioso “filho de homem” surge e se torna o centro da visão. Ele é uma personificação do povo fiel que recebe de Deus o reino que durará para sempre. As primeiras comunidades cristãs ao lerem o livro de Daniel, viram Jesus, como o instaurador do Reino de Deus. Jesus é o Messias, o Ungido de Deus; Ele é esse misterioso “filho de homem que vem do céu”. Jesus é o Filho amado do Pai que recebe o poder, a glória e a realeza, e a quem somos chamados a ouvir e a seguir.

Na segunda leitura (2Pd. 1,16-19), o apóstolo Pedro nos faz um breve discurso do que significou para ele a experiência de contemplar a Cristo transfigurado. Aquele acontecimento inesperado no Monte Tabor, tornou-se para ele e os outros apóstolos, a confirmação do que os profetas haviam proclamado ao longo da história de Israel. Ao aceitar o testemunho dos profetas presentes nas Escrituras, Pedro compreendeu que para conhecer o Cristo, não deveria fundar a própria fé sobre história fabulosas, mas sobre a Palavra mesma de Deus, ela que permanece como lâmpada que brilha para guiar para fora do lugar obscuro.

No Evangelho (Mt. 17,1-9) escutamos o relato da Transfiguração de Jesus. Numa catequese que toma emprestado elementos das teofanias do Antigo Testamento, o evangelista Mateus nos introduz em um momento de intimidade messiânica onde Jesus é revelado em plenitude como o Filho amado de Deus Pai que libertará a humanidade através do dom de sua vida divina. O quadro narrado reproduz uma realidade semelhante àquela apresentada na primeira leitura, no entanto, aprofunda o que se conhece como teofania. Se no livro de Daniel, Deus se revela através de imagens enigmáticas frutos de visões, aqui se realiza um encontro concreto. Deus é visto e ouvido, pois se faz presente, próximo e ao alcance de um toque de mão, tal qual João relatará em uma de suas cartas. (Cf: 1Jo 1, 1-4)

Neste pequeno relato, nos é apresentado um resumo de todos os momentos em que o povo de Israel fez experiência do encontro com seu Deus e que alicerçaram sua fé: o rosto resplandecente e as vestes fulgurantes recordam Moisés iluminado descendo do Sinai depois de encontrar Deus e receber as tábuas da lei (cf. Ex. 34,29); A nuvem que envolve a todos no Tabor, como quando Deus conduzia o povo no deserto ou quando manifestava sua presença através da fumaça do incenso na liturgia do Templo (cf. Ex. 33, 9-11; Ex. 40,35; Nm. 9,18.22; 2cr. 5, 13-14; Is. 6,4); Moisés e Elias representam a Lei e os Profetas que foram sinais do zelo do Senhor e que deveriam se manifestar quando a salvação definitiva se iniciasse (Cf. Dt. 18,15-18; Mal. 3,22-23); A atitude de estupefata admiração que rouba as palavras dos discípulos reproduz a atitude da humanidade diante da omnipotência e da majestade de Deus (Cf. Gn. 18, 1-3; Ex. 19,16; 20,18-21; Is. 6, 4-5). Até mesmo o convite de Pedro para armar tendas recorda a “festa das Tendas”, rito celebrado em recordação ao tempo que Deus habitou na tenda da Aliança com seu povo no deserto (Cf: Ex. 33, 7-8; Dt. 16, 13-15).

Mas afinal, porque Mateus oferece tanta informação implícita que remete ao Antigo Testamento neste relato? A comunidade para quem se destinou inicialmente este evangelho era composta de cristãos vindos do judaísmo, por isto o evangelista mantém o zelo catequético de ligar a ação de Jesus como realização definitiva daquilo que fundamentou a fé do povo de Israel. Em resumo: é a garantia de que a missão de Jesus é um projeto que vem de Deus. Para que não reste dúvida alguma de que Jesus Cristo é o Filho de Deus, o Messias libertador prometido pelo Pai.

A decisão de Jesus de revelar-se em plenitude e graça aos discípulos se trata de um alento para que eles mantenham o ânimo, a coragem e a esperança uma vez que a transfiguração acontece logo depois do primeiro anúncio de sua Paixão, Morte e Ressurreição (Cf: Mt. 16,21-23) e também da apresentação das exigências para ser seu discípulo (Cf: Mt. 16,24-28). Aos discípulos, desanimados e assustados, o próprio Pai fala diretamente e diz: “Escutai-o!”. Se Abrão que se lançou corajosamente em busca de uma terra prometida porque confiou na presença do Senhor ainda que invisível aos seus sentidos, muito mais os discípulos deverão se lançar para as águas mais profundas uma vez que têm o privilégio de ter o próprio Deus tornado visível ante seus olhos e coração.

O pedido de Pedro para armar tendas revela também a tentação de querer fugir da missão e permanecer em um eterno momento de revelação gloriosa. Tal atitude é reprovada por Jesus porque sua missão não é permanecer ali, pois, não será lá, no Monte Tabor, que Ele doará sua vida na cruz. Os discípulos precisam seguir caminhando com Ele para Jerusalém e também aceitar o fato de que no futuro todos eles terão o mesmo destino que o Mestre. No entanto, não é apenas o caminho da Cruz que se faz presente no horizonte de suas vidas, mas também o fulgor do sepulcro vazio que anuncia o ressuscitado vindo novamente ao seu encontro.

Como eles, nós, os discípulos atuais, somos convidados a subir um alto monte espiritual para nos aproximarmos de Deus e juntamente com seu Filho, Jesus Cristo, como outrora viveu seu Povo Santo, permanecer em atitude de ascese, confiança, esperança e fé. Mas, para isto é preciso descer do Tabor e permanecer no caminho da Cruz e entender que ela não se resume a morte, mas ao dom da vida, da entrega total, do amor até às últimas consequências. Este é também o centro e fundamento de toda vocação.

Em Cristo, Deus Se revelou a nós, que Nele cremos e Nele fomos batizados, recebendo o Seu Espírito; em Cristo, Deus veio ao nosso encontro! Ele Se fez um de nós, assumiu nossa pobreza humana para nos enriquecer com a Glória da Sua divindade. E essa Glória manifestada outrora sobre o Tabor é manifestada diante de nós, hoje, na Eucaristia que celebramos.

Pe. Paulo Sérgio Silva.

Diocese de Crato.

 

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