Poderíamos apreciar os bebês reborn como uma obra de arte que, como a escultura do David, de Michelangelo, consegue representar muito bem as feições humanas. Isso nos faria admirar a genialidade e a precisão dos detalhes, por exemplo. Porém, o que vemos é a tentativa do sujeito tamponar com esse boneco seus desejos, vazios, faltas e de não saber como lidar com seus traumas. Antes de qualquer julgamento de pessoas que fazem desses bebês reborn seus/as filhos/as, busquemos entender que esta cena, a muitos esdrúxula, esconde uma cena bem mais anterior e profunda. Diz-se inconsciente.
O cuidado que se dispensa a um bebê reborn é sintoma, uma representação, uma forma do sujeito lidar com o abandono, com o desamparo, com a falta de afeto, com o azedume da mágoa e do ressentimento, da ausência de alguém quando mais foi preciso, de um sofrimento difícil de nomear. Isto tudo denuncia pais, responsáveis e cuidadores, como também, toda a sociedade pela negligência no cuidado com o próximo. Estas pessoas, como aquelas que dispensam em excesso afetos a pet’s, estão dizendo: veja como eu gostaria de ser tratado, visto e cuidado.
O silêncio desses bebês representa a obstrução latente de uma voz infantil não atendida, mas que hoje clama a gritos largos no interior de cada um desses adultos. Fala ainda de dores não atendidas, relativizadas, diminuídas ou vistas meramente como “psicológicas”. Diz, outrossim, de um luto não curado, de uma perda não simbolizada, da inconformidade de não ter filho/a, ou a perda de um/a, ou de adulto com muitos déficit afetivos trazidos da infância. Essas pessoas tentam consertar por si as suas dores, angústias e sofrimentos, mais uma vez, sem ninguém.
Estes bebês reborn são sintomas, ou seja, eles tentam inibir uma situação traumática, é um meio de tentar solucionar o sofrimento de uma dor. E estão em função de uma angústia que precisa ser tamponada, que não se deseja mais reviver, sentir de novo. É alguém estilhaçado que procura juntar seus cacos, isto é, um meio de lidar com o sofrimento e a dor. É um modo de tratar certos acontecimentos da vida para saber levá-los. Por isso, cuidado com os risos e o menosprezo. O bebê apenas tenta substituir o vazio, o luto, a dor, a angústia, o sofrimento, o abandono, o desamparo e outras coisas mais.
Como dissemos acima, os cuidados a um bebê reborn manifestam carinho não dado, sentimento não vivido nem expresso, vontade de ser cuidado e de cuidar negligenciado, ausência de amor e de ser amado, a dor de ter sido abandonado, violentado, o luto não curado. Estas pessoas não estão dizendo apenas como queriam ser tratadas e cuidadas, elas nos dizem que precisam de nossa ajuda. E o que fazemos? Perceba o quanto estas pessoas estão substituindo um coisa por outra. E isso nunca as levará a cura. Elas só adiam o processo. É preciso fazê-las tocarem a realidade da vida, a entender que não existe amor sem perdão, entrega e convivência. Amar é mostrar-se vulnerável, é se deixar compreender pela frustração. Claro que é mais fácil cuidar de um boneco que não chora, não mama, não adoece, não faz exigências, nunca amadurece para confrontar.
Estamos diante de pessoas neurótica que vivem uma fantasia de controle. O outro nem sempre corresponde aos nossos anseios e idealizações. Tudo isso, como substituto da dor, pode até em certa medida nos ajudar, mas nos priva de existir. Que atitude tomar? Ajudar o outro a entender que a vida é maior e bem mais bela sem a fantasia. Encarar o fardo da própria existência onde de fato os afetos podem amadurecer e nos amadurecer. Acolher jamais significa concordar, mas ouvir atentamente e dar atenção ativa; é possibilitar a recomeço de uma vida ferida e machucada.
Pe. George de Brito
Estudante de psicologia 10/10
Bacharel e Mestre em Teologia
Licenciado em filosofia Especializado em filosofia hermenêutica




