VER COM OS OLHOS E O COM CORAÇÃO PARA SER VERDADEIRAMENTE DISCÍPULO
“E imediatamente, ele começou a ver e foi seguindo Jesus pelo caminho.” (Mc. 10,52)
Neste domingo, depois que celebramos o Dia Mundial das Missões, a Palavra de Deus nos convida a buscar Jesus Cristo, luz do mundo, e acolher o caminho de salvação que Ele veio apresentar a humanidade. Como Bartimeu, devemos deixar decididamente a vida antiga e seguir Jesus no caminho do amor e do dom da vida. Pois, somente acolhendo a proposta do Reino de Deus, poderemos passar da escravidão à liberdade, da morte à vida.
Na primeira leitura (Jr.31,7-9), em clima de rara e radiante alegria, o profeta Jeremias anuncia, para um futuro próximo, a libertação do povo de Israel exilado na Babilônia e os convida a retornar a Terra Prometida sendo conduzidos pelo próprio Deus, como zeloso pai que ama e cuida dos seus filhos. Se trata de apenas um pequeno grupo que retorna, mas é um sinal vigoroso de esperança, benevolência e salvação: são cegos, aleijados, grávidas e parturientes. Os cegos e aleijados são a expressão da caridade de Deus para com os abandonados, injustiçados e indefesos. As grávidas e parturientes são sinal de vida nova, recomeço da história do povo eleito. Aos reconhecer o zelo e cuidado do Senhor, Israel canta jubiloso: “Maravilhas fez conosco o Senhor, exultemos de alegria!”. (Sl. 126,3)
A segunda leitura (Hb. 5,1-6) apresenta, Jesus, a quem o Pai escolheu do meio do seu povo e que foi constituído como sumo sacerdote em favor da salvação deste mesmo povo. O sacerdote possui a função de ser mediador entre Deus e a humanidade; e Jesus Cristo, por ser verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem, tornou-se o sumo pontífice, isto é, a perfeita mediação capaz de realizar plenamente a comunhão/religação entre o divino e o humano. Todavia, para que possamos colher os frutos deste sacerdócio/mediação, se faz necessário que a humanidade “acredite” em Jesus, que escute sua Palavra e que a transforme em gestos concretos na própria vida.
No Evangelho (Mc. 10,46-52), continuamos acompanhando os últimos dias de missão de Jesus durante a peregrinação para Jerusalém com seus discípulos. O encontro de Jesus com este homem envolto em trevas pela cegueira é paradigmático. O evangelista o apresenta como último encontro de Jesus antes de sua entrada definitiva em Jerusalém para trazer luz ao mundo pelo mistério da Cruz e da Ressurreição.
A cura realizada, ao longo do caminho, apresenta o cego Bartimeu como modelo de fé e de discípulo missionário de Jesus Cristo enquanto revela a necessária e urgente conversão pela qual os discípulos deveriam passar uma vez que ainda alimentavam o desejo de um messias guerreiro e violento ao invés do Messias servidor. O cego Bartimeu em sua atitude de súplica e de seguimento se torna a imagem da Igreja em saída, Igreja Missionária que segue e anuncia a presença de Jesus Cristo no mundo.
São apresentados dois tipos de cegueiras: a cegueira física (o cego Bartimeu) e a cegueira espiritual (os discípulos). Bartimeu tinha consciência da sua condição e queria mudar, por isto diante de Jesus, grita e suplica com fé e esperança. Aqueles que acompanhavam Jesus, ao invés de facilitar o encontro, criam uma barreira tentando silenciá-lo. Os que tentam calar o cego representam todos aqueles que colocam obstáculos a quem deseja deixar a sua situação de miséria e de escravidão para aderir à proposta libertadora e salvadora que Cristo realiza. São aqueles que pensam ser “donos” da mensagem do Evangelho. O mundo constantemente irá querer silenciar nosso grito ao salvador. No entanto, se o mundo opor muralhas, devemos construir escadas para transpô-las e pontes para atravessá-las.
Se percebe o efeito da presença de Jesus. Marcos inicialmente descreve Bartimeu como alguém que até então está conformado com a sua condição existencial de viver na escuridão que o coloca na dependência, por isto, ele é apresentado “imóvel, sentado e pedindo esmolas”. Ao sentir a presença do Cristo que passa, o homem como que acorda de seu abatimento e percebe suas trevas e indigência. Num sobressalto, sua súplica manifesta seu desejo de reconstruir sua vida e que está enfastiado de viver longe da luz. Assim devemos ser também nós. Não usemos a fragilidade de nossa natureza decaída como justificativa para permanecermos imersos na situação do pecado. Rezemos, gritemos, supliquemos para que a graça rompa as trevas envoltas em nosso coração afim de que nossa consciência possa manifestar a luz que a gerou e da qual ela permanece como sinal, como imagem e semelhança.
Apesar da ação dos que querem silenciar o cego, Jesus, enfim, o ouve e o chama. Ao ouvir o convite, o cego joga o manto e pula. O manto era tudo o que ele possuía, logo, jogar o manto significa renunciar as próprias seguranças. O ato de renúncia tornou o cego uma pessoa livre. Por isso, o gesto de pular expressa alegria e liberdade. O seu salto é a expressão da mudança radical na sua vida, o efeito do encontro transformador com Jesus.
Diante da cura, do ato de passar do comodismo da escuridão para o ver da luz, o homem passa a seguir Jesus pelo caminho. Se torna Discípulo e Missionário. Em nossa vida, já reconhecemos nossa necessidade da presença transformadora de Jesus? Somos como Bartimeu que grita e suplica com fé ou somos como os discípulos que criam barreiras para silenciar a verdade e impedir que outros encontrem Jesus? Seguimos Jesus com alegria ou ainda estamos acomodados em uma poça de amargura e ressentimentos no caminho de nossa vida?

Pe. Paulo Sérgio Silva.
Diocese de Crato.




