REUNIDOS NA COMPAIXÃO DO BOM PASTOR
“Ao desembarcar, Jesus viu uma grande multidão e encheu-se de compaixão por eles, porque eram como ovelhas sem pastor.” (Mc. 6,34)
A liturgia deste domingo revela o amor e a misericórdia de Deus para com a humanidade ao apresentar a atitude compassiva de Jesus Cristo diante da multidão que o seguia. Essa compaixão revela-se em plenitude na oferta que Ele faz de si mesmo através da doação da vida do seu Filho, nosso Salvador.
Na Primeira Leitura (Jr. 23,1-6), em um oráculo pronunciado pela voz do profeta Jeremias, Deus condena os pastores desonestos e infiéis que enxergam o rebanho como meio para satisfazer os seus planos de poder e de promoção pessoal ao invés de protegê-lo. Deus, em sua compaixão, chamou-os a uma missão confiando-lhes o seu “povo-rebanho”. Eles, porém, depois de assumirem o compromisso, acabam por abandoná-lo – dispersando e machucando o rebanho ao invés de uni-lo e curá-lo – comportando-se de maneira perversa, irresponsável e ignorando o sofrimento do povo. Deus, então, irá cobrar daqueles que não zelaram pelo povo (sacerdotes, profetas e rei); reunirá o rebanho que estava disperso e o conduzirá à fecundidade, à vida em abundância, à paz e à salvação; fará surgir novos pastores para apascentar seu rebanho e enviará, por fim, o Messias que agirá conforme o coração divino. Infelizmente, ainda hoje sofremos do mesmo mal. Lideranças políticas – e às vezes até religiosas – estão preocupadas apenas em agradar aos ricos e aos poderosos, permanecendo indiferentes ao povo faminto de pão, de paz e de justiça.
Na Segunda Leitura (Ef. 2,13-18), São Paulo aprofunda o tema do zelo de Deus pelo povo, iniciado com o profeta Jeremias. O Apóstolo escreve para uma comunidade do mundo grego, ou seja, pagãos. Paulo os lembra que mesmo que eles não tenham, nos primórdios, feito parte do rebanho eleito (Israel), em Jesus Cristo, se tornaram parte do Reino pela redenção na cruz. Sim. A dedicação pastoral que Deus anunciou pelos profetas no A.T. manifestou-se em plenitude no N.T., através da entrega de Jesus Cristo que deu a toda humanidade, sem exceção, a possibilidade de entrar no Reino de Deus. Se todos são irmãos em Cristo, unidos e reunidos no amor, as divisões devem ser superadas e as diferenças esquecidas. Ao contrário do que os extremistas e fariseus modernos pensam e defendem, Cristo não veio para um grupo de privilegiados. Ele veio unir. “Veio para construir pontes e não muros”, como disse o Papa Francisco. As atitudes que pretendem catequizar, mas causam exclusão social, discriminação e injustiça não são sinais de uma fé autenticamente cristã. O que é decisivo, agora, não é a pertença a um determinado povo, fé ou raça, mas a forma como se responde à proposta de Vida e Verdade que Jesus faz.
O Evangelho (Mc. 6,30-34) nos coloca diante de Jesus acolhendo os discípulos quando retornam da missão para a qual o Senhor os enviou no Evangelho do domingo passado. Cansados e animados, eles partilham as expectativas, esperanças e comunicam os acontecimentos e ensinamentos da missão. Jesus os ouve e os convida a um lugar deserto, distante da multidão. A atitude de retirar-se não era uma decisão apenas para descansar, mas também para avaliar a missão e planejar as próximas ações missionárias. Lembremos que o deserto, na bíblia, é o lugar da aliança de Deus com seu povo. Por isto, mesmo se isolando no deserto, os discípulos contemplam a multidão acorrendo em direção para lá encontrar Deus na pessoa do seu Filho Jesus Cristo. O Mestre Jesus se compadece pelos sofrimentos e necessidades do povo, assim como Deus teve compaixão do povo no deserto (Ex. 34,5-6; Dt. 32,1-12; Is. 40,11).
Os discípulos entendem paulatinamente que são continuadores dessa missão. Eles testemunham o amor, a bondade e a solicitude de Deus pelos seres humanos que caminham no mundo perdidos “como ovelhas sem pastor”. Neste sentido, temos consciência de que buscar o fim do sofrimento da humanidade é responsabilidade nossa, porque somos os discípulos que Jesus envia em missão?
Qual é, portanto, a missão dos discípulos de Jesus? Combater tudo que escraviza e fere a humanidade, impedindo-a de ser feliz. O discípulo, então, deve permanecer tendo Jesus como modelo e centro de sua vida e missão. Mas para que isso aconteça, a cada ação missionária realizada, a cada anúncio da Boa Nova feito, o discípulo deve retornar sempre a Jesus, para ouvi-lo, dialogar com seu coração de Bom Pastor, escutar os seus planos e elaborar com Ele os projetos missionários.
Nossa missão não pode ser realizada separada daquilo que Jesus ensinou, viveu e praticou. Um grande problema pastoral atual é a nossa dificuldade em entender o que é compaixão. Vivemos uma era de permissividade, de libertinagem e hedonismo, por isto muitas vezes confundimos compaixão com a atitude de acolher a pessoa, mas sem lhe fazer o querigma. E assim a pessoa conhece um “fantasma” que ela pensa ser Jesus Cristo. Um fantasma emocional e condescendente, mas que não leva a conversão que conduz a Deus. Por isto que boa parte daquela multidão numerosa que seguia Jesus para todos os lugares acabou por abandoná-lo. Porque eram discípulos da curiosidade e dos interesses individualistas, não do redentor.
Como a multidão muitas vezes seguimos os passos de Jesus, mas não pelas razões certas. O Cristo não deve ser objeto de curiosidade, mas de predileção e de prioridade. O Cristo deve ser buscado pelo que é em si mesmo: Deus, Salvação, Bem. O nosso coração deve sofrer e a nossa consciência deve nos inquietar quando encontrarmos alguém humilhado, explorado, marginalizado, tendo seus direitos e sua dignidade negados. Seguindo o exemplo do próprio Jesus não devemos ficar acomodados no emocional, na comoção paralisadora. Devemos deixar que a nossa compaixão também nos leve a agir por nossas ovelhas, defendo-as e sarando-as do mal que o pecado causou entre nós.

Pe. Paulo Sérgio Silva
Diocese de Crato.




