HOMILIA DO 2º DOMINGO DA QUARESMA – ANO B

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TRANSFIGURADOS COM CRISTOS, POR CRISTO E EM CRISTO

Este é o meu Filho amado. Escutai o que Ele diz!” (Mc. 9,7)

Amados irmãos e amadas irmãs!

            No segundo Domingo da Quaresma, a Palavra de Deus indica o caminho que o verdadeiro discípulo deve seguir para chegar à vida nova que a aliança com Deus oferece: é o caminho da escuta atenta e da adesão a vontade de Deus e dos seus planos. Pela vida e missão de Jesus Cristo compreendemos que o caminho da obediência total aos planos do Pai é o caminho que conduz a vida plena. Ao apresentar o mistério da Transfiguração, a liturgia nos recorda que é agora o momento propício para cada um de nós realizar o encontro com Deus e ouvir sua vontade.

Na primeira leitura (Gn. 22,1-2.9a.10-13.15-18), o Gênesis, nos apresenta a Abraão como modelo de fé diante de Deus. Abraão é homem piedoso e fiel, que vive uma permanente escuta e abertura aos apelos divinos, que aceita os seus chamados e que lhe responde com a obediência total (mesmo quando os planos divinos parecem ir contra as promessas que o próprio Deus havia feito). Deste modo, Abraão tornou-se o modelo de fé para todas as religiões, uma vez que soube escutar Deus e acolher os seus planos com obediência incondicional, com confiança total. No lugar do filho de Abraão, Isaac, é oferecido um cordeiro que foi encontrado com a cabeça presa em um espinheiro. Na plenitude dos tempos não será um anjo que revelará a vontade do Pai, mas o próprio Deus na pessoa do seu Filho que nos conduzirá ao alto do Calvário e nos revelará que a vontade Deus é salvar toda a humanidade. Dois mil anos depois, Deus novamente oferecerá um cordeiro envolto em espinhos para resgatar a humanidade, pois, de modo semelhante, Cristo será coroado de espinhos antes de ser posto na cruz. Assim, todos nós somos chamados a acolher os planos de Deus e realizá-los com fidelidade, mesmo que as propostas de Deus às vezes pareçam incompreensíveis ou que os seus planos estejam colidindo com os nossos planos pessoais.

Na segunda leitura (Rm.8,31b-34), São Paulo nos lembra que Deus ama com um amor incomensurável e eterno. Jesus Cristo, o seu Filho amado, com sua doação na cruz, tornou-se a manifestação definitiva deste amor. Sendo assim, o cristão nada tem a temer. Deve enfrentar a vida com serenidade, esperança e confiando totalmente no amor de Deus. Pode, portanto, como Jesus Cristo, entregar a sua vida como dom, lutar pela paz e pela justiça, enfrentar os poderes da violência e da morte, porque confia no Deus que o ama e que não o deixará desamparado no momento propício. Nos indaguemos interiormente: O que nos impede de ter total confiança em Deus como Abraão e como Jesus Cristo? Porque acreditamos mais no poder do pecado do que no poder da Graça?

No Evangelho (Mc.9,2-10) ouvimos o relato da transfiguração de Jesus. É preciso manter-se atento aos detalhes presentes nos símbolos e sinais que Marcos imbui na narração para poder colher todos frutos de sua catequese. O lugar para o qual o Mestre conduz os discípulos é uma montanha – que mesmo não sendo nomeada no relato de Marcos – nos remete ao lugar privilegiado da revelação no A.T., pois é no monte (lugar elevado) que Ele faz uma aliança com o seu Povo e dá a Moisés as tábuas da Lei (Ex. 34,1-4). A nuvem que os envolve lembra a nuvem que acompanhava o povo eleito, durante o dia, na travessia do deserto e que preenchia a tenda do encontro nos ritos litúrgicos (Ex. 14,19-20; Ex. 40,34-35; Nm. 9,18.22; 10,34). As roupas que adquirem um tom de brancura sobrenatural e a transfiguração do rosto de Jesus fazem alusão ao resplendor que incidia do rosto de Moisés ao descer da montanha sagrada (Ex. 34,29-30). As visões de Moisés e Elias representam a Lei e os oráculos dos Profetas que prenunciaram a vinda do Messias e a salvação (Dt. 18,15-18; Ml. 3,22-23). O espanto e o temor reverencial que tomam conta dos discípulos são a reação que as pessoas de fé têm diante da omnipotência e da transcendência de Deus (Ex.19,16; 20,18-21; 34,30-35).

Ao recorrer a elementos simbólicos do Antigo Testamento, o evangelista apresenta-nos uma catequese para revelar que Jesus vai concretizar a libertação e salvação da humanidade através da doação da própria vida.  Jesus é o Filho amado de Deus e Nele se manifesta a glória do Pai. Ele é, também, o Messias libertador e salvador esperado por Israel, anunciado pela Lei (Moisés) e pelos Profetas (Elias).  Ele é um novo Moisés, pois é através dele que Deus dá ao seu Povo as novas definitivas lei e Aliança. A transfiguração nos ensina que a morte não terá a palavra final, pois no fim do caminho de Jesus (e no caminho dos discípulos que o seguirem Jesus) para além da aparente derrota da cruz, está a ressurreição, a vida plena, a vitória definitiva sobre a morte.

Os três discípulos, testemunhas da transfiguração, com sua atitude inicial, demonstram não ter muita vontade de descer e enfrentar o mundo e seus os problemas. Eles representam todos os que vivem de olhos voltados ao céu, querendo fugir da responsabilidade da missão de renovar e transformar o mundo. Todavia, para permanecer no céu será preciso primeiro transfigurar o mundo com a vivência do Evangelho. A transfiguração é o prenúncio da Ressurreição. Somente quem percorre todo o caminho da existência ao lado de Jesus haverá de partilhar com Ele a glória da Ressurreição. Sendo a quaresma tempo de conversão, de transformação, de renovação, o que preciso “transfigurar” no meu modo de pensar e agir, na minha existência integral, para me tornar um verdadeiro discípulo missionário?

 Nossa missão é, portanto, regressar ao convívio com a comunidade depois de fazer a experiência do encontro com Jesus e se manter fiel ao chamado de Deus Pai que nos recomenda insistentemente: “Este é o meu Filho amado. Escutai o que Ele diz!”

Pe. Paulo Sérgio Silva

Diocese de Crato.

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