A barca da Igreja não deve temer, porque é guiada por Cristo

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HOMILIA NA ÚLTIMA NOITE DA NOVENA DA

FESTA DE NOSSA SENHORA DA PENHA

Catedral, 31 de agosto de 2015

 

Amados irmãos e irmãs, queridos sacerdotes, religiosas, seminaristas, leigos e leigas.  Nesta noite, concluímos a solene Novena em preparação à festa de nossa Excelsa Padroeira desta Diocese e da cidade de Crato, Nossa Senhora da Penha. Alegremo-nos todos no Senhor pela celebração de tão grande festa. Saúdo a todos e a todas vocês que, em grande numero,  atraídos pelo brilho de Maria Mãe, Rainha e Serva, respondemos ao convite para com a Mãe da Penha, em Jesus, chegarmos à glória. Este é o tema da Novena e da Festa de Nossa Senhora da Penha, no ano de 2015. Contemplamos, deste modo, o que rezamos no quinto mistério glorioso do Santo Terço: a coroação de Nossa Senhora Rainha do céu e da terra. Olhemos para nossa Mãe Santíssima na glória do céu: ela que nos precedeu na alegria eterna do Paraíso, pela sua  fidelidade comprovada a Jesus e ao Evangelho. Lembramos todos com gratidão e emoção a celebração do primeiro centenário da nossa Diocese no ano passado, cujo momento mais simbólico e expressivo foi sem dúvida a coroação da imagem de Nossa Senhora da Penha, realizada pelo Cardeal João Brás de Aviz, em nome do Papa Francisco, na presença de todos os Bispos das Dioceses do Ceará. A distância de um ano, queremos reafirmar aquele gesto de devota e filial veneração, com o coração em festa, porque a Mãe de Deus é coroada. É ela que nós glorificamos com nossos hinos e nossos cantos. Ela é nossa Mãe, Rainha e Serva.

Nesta noite estamos também concluindo, em oração com Maria, o mês de agosto, o mês das vocações. Com um olhar de síntese, repassando diante da nossa mente as motivações que neste mês vocacional refletimos e rezamos, recordamos que somos todos chamados para viver uma vida santa, qualquer que seja a vocação específica de cada um de nós na Igreja e no mundo. Maria, a Mãe de Jesus e nossa Mãe, serviu ao Senhor com retidão e justiça, buscando sempre fazer a vontade de Deus: “Eis aqui a serva do Senhor”. Pela sua obediência ao Pai, tornou-se Mãe do Verbo de Deus feito homem em seu seio virginal. E pelo seu “sim” a Deus muitos outros “sim” a Deus se inspiram no dela, e Ela, com razão,  é invocada Rainha dos cristãos. Aprendemos de Nossa Senhora que o culto que agrada a Deus nasce do coração, da adesão interior, desse nosso centro íntimo de onde nascem nossas decisões e projetos. A santidade de Maria Mãe é também a nossa busca. “Sejais santos como Deus vosso Pai é santo”, nos recorda a Bíblia Sagrada.

O Papa emérito Bento XVI disse que a santidade é medida alta da vida cristã. Os santos são como as placas nas estradas que nos orientam no caminho da vida. A santidade «não consiste em fazer empreendimentos extraordinários, mas em unir-se a Cristo, viver os seus mistérios, fazer nossas as suas atitudes, pensamentos e comportamentos». Em síntese, a santidade consiste em amar a Deus e ao próximo. Nossa Senhora fez da busca da santidade o seu testemunho.  A nossa Diocese centenária, romeira e missionária, é o rebanho convocado a ser testemunha da verdade. Testemunha de Cristo. Testemunha da caridade e da misericórdia! Nós invocamos nas Ladainhas a Santíssima Virgem com o título de Rainha dos Mártires. A santidade passa pelo testemunho da fé e testemunhar a santidade de Deus nos torna mártires.

Quando falamos em mártir pensamos logo em morte, ou em alguém que morre por uma causa. Martírio cristão não é isto. Também terroristas morrem por uma causa e não são verdadeiros mártires. Morrem motivados pelo ódio, para destruir a outros. O mártir cristão é diferente, morre por fidelidade à fé que professa, morre perdoando seus inimigos e unindo sua paixão a paixão de Cristo, o mártir dos mártires. O mártir cristão não tira a vida, mas doa a vida por amor.

A palavra mártir é uma palavra grega que significa testemunho! Os numerosos cristãos, que nos primórdios da Igreja, foram perseguidos e assassinados, antes de serem condenados à morte, tinham o direito de dar uma palavra, de proferir um testemunho. Este momento era fascinante porque naquele exato momento, cheios do Espírito Santo, como prometera Cristo, os cristãos professavam a sua fé na ressurreição dos mortos! E morriam cantando, salmodiando, louvando a Deus por unirem-se a Cristo por uma morte semelhante à sua!

Na Igreja de Cristo nunca faltaram mártires! Jesus havia dito: “Se me perseguirem, perseguirão a vós também” (Jo 15,20).

Tertuliano, escritor Patrístico, diante do testemunho dos cristãos, seus companheiros, no final do século II, início do século III, não hesitava em proclamar: “O sangue dos mártires é semente de novos cristãos” (Apologia 50,15). E assim foi e assim será. O Concílio Vaticano II assim proclamou na Constituição Dogmática Lumem Gentium:

Desde os primeiros tempos, e sempre assim continuará a suceder, alguns cristãos foram chamados

a dar este máximo testemunho de amor diante de todos, e especialmente perante os perseguidores…

embora seja concedido a poucos, todos, porém, devem estar dispostos a confessar a Cristo diante

dos homens e a segui-lo no caminho da cruz em meio das perseguições que nunca faltarão à Igreja (LG 42).

Irmãos e irmãs, eis que estamos vivendo um tempo de crise no cristianismo. E na nossa Diocese não é diferente. A nossa Igreja diocesana está navegando em meio a uma tempestade suscitada por ventos contrários ao sopro do Espírito de Deus. O Evangelho exorta todos nós ao exercício da humildade, a comprovar e a reconhecer onde estamos, aonde havemos de tender e de apressar o passo. A barca que transportava os discípulos no lago e que tinha o vento contrário, era agitada pelas ondas. Lembremo-nos como, não sem razão, o Senhor, subiu ao monte para orar a sós e, mais tarde, aproximou-se dos discípulos, andando sobre o mar, e encontrou-os em perigo, infundiu-lhes ânimo, subiu à barca, e apaziguou as ondas.

O Santo Padre João Paulo I, na sua primeira mensagem após a eleição à Cátedra de Pedro, assim se expressou: Com a nossa mão apertada na de Cristo, apoiando-nos n’Ele, também Nós subimos ao leme desta barca que é a Igreja. Ela tem estabilidade e segurança, mesmo nas tempestades, porque leva consigo a presença confortante e dominadora do Filho de Deus. Segundo as palavras de Santo Agostinho, a barca da Igreja não deve temer; porque é guiada por Cristo: “Mesmo agitada, a barca não deixa de ser barca. Só ela transporta os discípulos e recebe Cristo. Enfrenta perigos no mar, mas, sem ela, imediatamente se perece” (Santo Agostinho, Sermão 75, 3; PL 38, 475). Só nela se encontra a salvação: sem ela perece-se! Faço minhas estas palavras do Papa João Paulo I de santa memória.

O mesmo  Santo Agostinho, Bispo de Hipona, numa das suas homilias  alertava os fiéis dizendo: a barca que leva os discípulos, isto é, a Igreja, flutua sacudida pelas tempestades das tentações… Mantém-te, pois, na barca e ora a Deus… Quem presta ajuda aos navegantes para que cheguem ao porto, abandonará, por acaso, sua Igreja, permitindo que ela não chegue ao descanso?».

Queridos irmãos e irmãs,  o mundo clama por testemunhos, por pessoas que sejam firmes, que falem a verdade, a verdade que não nos oprime, mas pelo contrário que nos liberta (Jo 8, 32) a verdade que nos conforta e também nos incomoda, e não nos esqueçamos: Cristo é a verdade!

O Servo de Deus, o Papa Paulo VI, quando escreveu sobre a evangelização, pronunciou uma frase emblemática: “os homens de hoje, escutam muito mais as testemunhas que os mestres, e se escutam os mestres é porque são testemunhas”. Nesta vigília da festa de Nossa Senhora da Penha, padroeira da nossa Diocese, quero reafirmar para vocês e com vocês o meu anseio de servir esta Igreja diocesana, para a qual me enviou o Papa São João Paulo II. Embora sendo um vaso de argila, com os meus limites humanos, quero doar a minha vida pela santificação deste Povo de Deus que é a Diocese de Crato.

O Hino da Campanha da Fraternidade desse ano canta o meu desejo, o meu projeto, a minha missão como bispo de vocês:

“Em meio às angustias, vitórias e lidas,

No palco do mundo, onde a história se faz,

Sonhei uma Igreja a serviço da vida.

Eu fiz do meu povo os atores da paz!

                 Quero uma Igreja solidária,                 

Servidora e missionária,

Que anuncia e saiba ouvir.

A lutar por dignidade,

Por justiça e igualdade,

Pois “Eu vim para servir”.

Este é o sonho do Papa Francisco .  Este é meu sonho. Gostaria que fosse o sonho de cada sacerdote desta diocese, de cada seminarista, de cada religioso ou religiosa, de cada leigo e leiga, também dos movimentos, pastorais e serviços.

Todos, com zelo, amor e sabedoria, sonhemos juntos e realizemos esse sonho juntos. “Um sonho que se sonha só, é pura ilusão,  é sonha só; mas sonho que se sonha junto é realidade”, dizia Cervantes.

Peço a Nossa Senhora da Penha, Mãe, Rainha e Serva do Povo de Deus, que interceda por nós, que arranque do nosso coração todo tipo de medo e covardia, que nos faça a cada dia, mais simples, mais humildes, mais pobres, mais comprometidos com o Reino; que nos livre de toda espécie de ambição terrena, que nos conceda sabedoria divina, para sermos “simples como as pombas e prudentes como as serpentes”, fortes e coerentes na verdade, sem perder a ternura.

Que assim seja! Amém!

*Esta Homilia se inspira em textos de estudos e documentos do Magistério.

 

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